1. Tabu (2012) – 52 pontos 2. Le Havre (2011) – 51 pontos 3. A torinói ló (O Cavalo de Turim, 2011) – 38 pontos 4. 4:44 Last Day on Earth (4:44 Último Dia na Terra, 2011) – 28 pontos 5. Amour (2012) – 24 pontos 6. Bir zamanlar Anadolu’da (Era uma Vez na Anatólia, 2012) – 22 pontos 7. Moonrise Kingdom (2012) – 19 pontos 8. Kiseki (O Meu Maior Desejo, 2011) – 18 pontos 9. J. Edgar (2011) – 17 pontos 10. Oslo, 31. august (Oslo, 31 de Agosto, 2011) ex aequo com Holy Motors (2012) – 14 pontos
2012 será sempre um ano muito especial para todos nós. Foi no seu mês de Julho que o À pala de Walsh se lançou no ciberespaço, com o objectivo de trilhar novos caminhos. Tudo começou com uma reflexão colectiva em torno da crítica de cinema e agora não tudo mas apenas o ano termina com o inevitável Top 10, elaborado por todos os redactores que acompanharam de perto as estreias em sala. Olhando para o Top colectivo, importa agora lançar a questão: o que fará destacar este de outros anos de cinema? Desde logo, e cingindo-nos à evidência dos resultados, importa assinalar a diversidade de proveniências dos filmes aqui apresentados: Portugal, Finlândia, Hungria, França, Turquia, Noruega, Japão e Estados Unidos. A maior representatividade norte-americana está à vista, com os mais recentes filmes de Ferrara, Wes Anderson e Eastwood, mas a verdade é que nenhum deles entra no pódio. Os filmes de Miguel Gomes e de Aki Kaurismaki disputaram “taco a taco” o primeiro lugar, mas é significativa a distância “pontual” para o filme de Tarr, como deste para o filme de Ferrara. A maior parte dos participantes queixa-se, nos seus textos individuais, da baixa qualidade média deste ano cinematográfico, algo que se manifesta numa certa polarização dos “votos” em dois ou três títulos. 2012 foi um ano difícil para quem gosta de ser muito original neste género de exercícios cinéfilos. De qualquer modo, o À pala de Walsh esforçou-se por impor a diferença, mas sem roubar a esta iniciativa o respeito pelo valor relativo de cada obra no contexto geral do ano.
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Apesar de alguns filmes fortes, não vejo 2012 como um ano de grande qualidade nas nossas salas de cinema. Mas duas obras-primas intemporais destacam-se: Tabu de Miguel Gomes, um dos melhores filmes que o cinema português já realizou, e Amor de Michael Haneke, um filme que ficará também no cinema europeu (ou o que existe dele). Um Amor de Juventude vem precisamente daquela que considero ser uma das autoras mais interessantes desse cinema – Mia Hansen-Løve, alguém que encontrou um justo ponto, como uma nota ou um traço de luz, entre o seu percurso biográfico e o espelho do cinema, servindo-se deste como quem deseja viver de uma forma mais completa e em sintonia com o mundo (e que assina aqui um filme de uma sensibilidade já extinta). Mas o filme mais contemporâneo deste ano – se é que nos podemos servir de tal palavra – será O Gebo e a Sombra de Manoel de Oliveira, ou aquele que nos diz mais sobre o que é viver neste nosso presente (e que trouxe um inesquecível encontro entre Jeanne Moreau, Claudia Cardinale, Michael Lonsdale e Luís Miguel Cintra). Nota também para Holy Motors, um filme livre que não nega, por outro lado, a prisão de se viver sempre dentro do cinema (um filme de amor, como também de perdição). E num registo totalmente diferente (e fora de qualquer lista): The Perks of Being a Wallflower. Um objecto que perder-se-á no tempo mas que cumpriu a função dos filmes inesperados: entrar numa sala de cinema, numa decisão quase efémera, para ver fantasmas que nos digam algo sobre nós e salvar-nos, assim, das pequenas desistências da vida. E que o cinema nos faça sentir – não sabia que alguém reparava em nós. Que esse desígnio prevaleça. |
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É sempre difícil chegar a uma leitura comum num universo tão diverso de filmes, mas existem dois sentimentos que se destacam transversalmente nesta selecção: desespero e ternura. Da Grécia, vem a surpresa de uma primeira obra (Attenberg), onde o desespero manifesta-se em novas formas de expressão. Há uma epidemia que se alastra no cinema americano (Procurem Abrigo e Martha Marcy May Marlene) – o medo da loucura – sendo esse desespero mais imediato na história de um fantasma que se examina ao espelho (Oslo, 31 Agosto). Uma aventura à procura de um cadáver mostra-nos um desespero sem cura (Era Uma Vez na Anatólia). Mais sufocante é um último alerta ao eclipse da humanidade em O Cavalo de Turim: incansável e inabalável. Há também ternura latente na dedicação dada às personagens, quer na adaptação da história de uma comunidade a um filme próximo de Ozu (Le Havre), quer no original retrato impressionista (O Monte dos Vendavais), adaptação de uma das histórias mais velhas do mundo. Sobre o amor impossível, triunfa quanto à forma um filme quase mudo (Tabu), que muito diz sobre esta relação entre o desespero e a ternura, tal como a história comovente de um casal (Amor) condenado à derradeira prova de dedicação. |
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A culpa pode ser minha – terei visto menos filmes, não os terei escolhido bem – mas, desde que faço listas de fim de ano (esta é só a terceira vez, o que vale o que vale), nunca tive tanta dificuldade em encontrar “os dez melhores do ano”. Normalmente, até ficava com uns de fora, que mereciam uma menção honrosa. Em 2012, houve muita fita simpática, daí que tenha conseguido chegar ao número dez, todavia foi em esforço, a partir do oitavo não são os “melhores”, são os que havia. Por outro lado, dá-me ideia de que algumas menções honrosas de 2011 entravam perfeitamente neste top. Não quero entrar em discursos pessimistas ou catastrofistas, mas aquele que é claramente o melhor filme do ano a estrear em Portugal é de 1958 e chama-se Vertigo (A Mulher Que Viveu Duas Vezes). É óbvio que esta observação é perfeitamente injusta, a obra-prima de Hitchcock seria o melhor filme do ano em quase todos os anos (foi eleito o melhor de sempre na última votação da Sight & Sound), só que inclui-lo nesta lista (o que pensei em fazer), pese embora a beleza dos filmes de Gomes, Chabrol, Kaurismaki, Ferrara, Anderson, Tarr e Tocha, seria quase uma heresia. |
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2012 está a acabar e nem vi metade dos filmes que queria ver. De fora, portanto, ficam filmes que talvez não ficassem se os tivesse visto. À cabeça vêm-me os novos de Manoel de Oliveira, Chantal Akerman, o último Chabrol (estrado com três anos de atraso) e deve haver mais uns quantos que me estou a esquecer. Em relação a ciclos e exibições, gostava de fazer menção aos ciclos da Cinemateca dedicados aos anos 70 e 80 e à mostra de cinema espanhol, a Cinefiesta, que foi a Lisboa e ao Porto durante os meses de Novembro e Dezembro. Falando de estreias, o que me ficou gravado na retina este ano (e sem querer desmerecer os restantes filmes da lista) foram o desbravamento de Herzog e a sua equipa de quatro pelas cavernas de Chauvet, as cores e construção clássicas de Le Havre e as viagens de Denis Lavant por Paris com Édith ‘Christiane’ Scob ao volante. Se calhar não interessa muito entrar em comparações destas, mas opondo-os a outros filmes estreados este ano, Cave of Forgotten Dreams (o 3-D que mergulha no passado e nas raízes do cinema), Le Havre (conto moral contemporâneo) e Holy Motors (elegia episódica) ofereceram-me o que, respectivamente, Hugo, Shame e Tabu não conseguiram oferecer. E fica a nota, já agora, de que não consegui passar dos primeiros cinco minutos de Cosmopolis e Prometheus. Talvez um dia. |
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Alguns dos filmes deste ano globalmente pobre de cinema procuraram identificar os sintomas da crise identitária que assola o planeta. Os últimos filmes de Ferrara, Cronenberg e Carax foram os que melhor souberam articular as transformações que o digital ou o espaço virtual tem vindo a operar sobre a nossa relação com o mundo, seja de um ponto de vista metafísico, social, económico, “cultural” ou puramente cinematográfico. Foi também a propósito de uma profunda crise ontológica, sem fugir à questão das “mediações”, que Béla Tarr realizou aquele que é, de longe, o melhor filme de 2012, a obra-prima que fará varrer para cima dos outros títulos a poeira do esquecimento. Contudo, por exemplo, o filme de Dumont surge envolto numa aura semelhante que nos faz crer ainda nos pequenos grandes milagres do cinema: os gestos, os rostos, a paisagem e as “luzes silenciosas” que os re-ligam. De igual modo, foi um prazer visitar alguns dos mais deslumbrantes refúgios da liberdade infantil e da recreação cinematográfica em Wes Anderson, Miguel Gomes e Kore-eda. Gostei de ver David Fincher regressado à boa forma. A história de amor entre Daniel Craig e Rooney Mara, mais que o invólucro do thriller, foi das melhores coisas que a sua câmara filmou. Sedução fria e formal foi o que encontrei no mais recente filme de Rafi Pitts e na perturbante mas (moralmente) muito desafiante primeira obra de Schleinzer. Outros filmes que elevaram a fasquia mas que não cabem no top: Rafa, A Vingança de Uma Mulher, Oslo, 31 august, J. Edgar, Take Shelter, Bernie, Martha Marcy May Marlene, The Perks of Being a Wallflower, The Artist, Nana, Margin Call, Attack the Block e Our Idiot Brother. Falhas a registar: últimos de Oliveira, Akerman, Ceylan e Chabrol. |
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Andei a atrasar a escrita destes dois parágrafos por não saber bem o que dizer. Ai que ano tão mau; nem por isso. Ai o domínio americano; nem por isso. Ai o fim do mundo; ao que parece nem por isso. Então o que houve em 2012 que mereça surgir aqui como epitáfio do ano cinéfilo? O cinema português que este ano tomou todos os tops de assalto (e pena a minha não ter espaço para Linha Vermelha ou Em Câmara Lenta); Matthew McConaughey é o actor-surpresa do ano (Bernie, Magic Mike, The Paperboy e esse filme que está a caminho do esquecimento total das distribuidoras, Killer Joe); 2012 é o ano das confirmações, quase todos os realizadores presentes já haviam tomado posições em tops meus de anos anteriores; 2012 é também o ano dos filmes arrebatados, por fantasmas, por memórias, por histórias maiores que a vida ou por simples milagres. Dito tudo isto talvez convém justificar as ausências: Haneke ficou à porta pelos motivos que já pude discorrer aqui no site; Carax também, porque me pareceu que toda aquela “beleza do gesto” não era mais que isso mesmo, gestos bonitos; Tarr ficou à porta mas ainda o ouço a bater a maçaneta de ferro. De todos os filmes que deixo de fora esse é o que mais me custou (os irmão Taviani também), por ser um edifício de monumentalidade tão gigante que deixá-lo de fora é simples provocaçãozinha de chico-esperto. Na verdade foi mais que isso, há filmes menos bons (em termos puramente analíticos) no meu top que A torinói ló, no entanto creio que o gosto é a única arma definitiva nesta história das listas e dos tops e convenhamos, o filme de Tarr incomoda-me de uma forma que eu não gosto de gostar. E sinceramente, adoro gostar de Haywire. |
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Algumas desilusões (Carax, Cronenberg, Spielberg, Ferrara, McQueen, embora, pelo menos, os dois primeiros sejam casos a rever com outra atenção e se possível sem dores de cabeça), uma obra interessante [Take Shelter (Procurem Abrigo, 2011)] mas cuja emoção passou-me ao lado. Além da lista publicada aqui ao lado, apreciei deveras os últimos Burton (o meu preferido dele numa década), Gomes (que bate mais fundo quanto mais se pensa nele), e o Polisse (Polissia, 2011) de Maiwenn. Não tão em alta conta mas igualmente elogiados podem ser Cave of Forgotten Dreams (A Gruta dos Sonhos Perdidos, 2010), Haywire (Uma Traição Fatal, 2011) – o bom Soderbergh do ano – e o Bellamy (Inspector Bellamy, 2009) chabroliano, o melhor filme do ano em termos puramente culinários e vinículas, e apesar (ou por causa) da sua completa vacuidade, o filme romano do Woody. No departamento guilty pleasures, só me consigo lembrar do novo capítulo do American Pie, o que demonstra, infelizmente, que no capítulo do gostoso mau cinema este foi um ano aziago para os americanos. E ainda faltou ver muita coisa que poderia ser vista (Oliveira, Haneke, Massadian, Hirokazu, etc), para assim se completar, na medida do possível, o currículo cinematográfico do ano. |