No final da sessão, uma pessoa muito mais sabida do que eu, que por diversas vezes teve o privilégio de ver o filme em película, comentava com desalento que na novíssima cópia digital da obra-prima intemporal de Alfred Hitchcock se perdiam as texturas da imagem e o som era quase irreconhecível. Penso que eu já venho de uma geração que terá descoberto os filmes de Hitchcock em DVD, antes de ter tido o supremo privilégio de os apreciar no grande ecrã. Quando ouvi essa pessoa que respeito muito e me apercebi da sua “indignação” ainda estava sob o efeito do meu primeiro visionamento em sala de Vertigo (A Mulher Que Viveu Duas Vezes, 1958), pelo que as cores, a música e os temas persistiam em me obcecar. Depois, esfriando a cabeça, pensei: nestes tempos em que a película ameaça desaparecer em virtude da cópia digital, os que puderam experienciar qualquer coisa mais próxima do “original” estão também eles condenados, como o protagonista do filme, a (sonhar) refazer a sua Madeleine, ou melhor, a (sonhar) refazer o seu Vertigo.
O presente texto foi publicado no livro de compilação O Cinema Não Morreu – Crítica e Cinefilia À pala de Walsh. Pode adquiri-lo junto da editora Linha de Sombra, na respectiva livraria (na Cinemateca Portuguesa), e em livrarias seleccionadas.
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