A promessa dos minutos iniciais de The Hunter (O Caçador: Último Tigre da Tasmânia, 2011) – uma cena seca em que o diálogo se faz sobretudo da troca de olhares; outra que mostra Willem Dafoe num quarto de hotel, onde se fecha em pequenas obsessões compulsivas – não se cumpre na restante hora e quarenta. Os planos de grua e as imagens aéreas da “beleza natural” da paisagem australiana (a Tasmânia) logo indiciam o gosto decorativo do realizador Daniel Nettheim.
Em boa verdade, The Hunter é um thriller ambientalista um tanto mal amanhado, ou melhor, muito previsível – contratado por uma empresa de bioquímica para capturar um tigre da Tasmânia (como o título português refere, o último da espécie, que aliás toda a gente julga extinta), Dafoe vê-se metido entre os locais que o querem ver dali para fora, pois pensam que é mais um ecologista, e os ecologistas que o olham com desconfiança (todas estas personagens não passam de bonecos), mas sobretudo entre o trabalho sujo (é uma espécie de mercenário da caça) e a ternura que começa a sentir pela família que o acolhe (uma mulher cujo marido desapareceu em circunstâncias misteriosas e os dois filhos) -, pelo que a realização não é responsável por tudo.
Também é verdade que o filme tem coisas interessantes: o triângulo amoroso entre a “viúva”, Dafoe e a personagem de Sam Neill (bastante mal aproveitados: Neill, o despeitado que procura vingança, e o triângulo); as cenas de Dafoe na floresta, preparando armadilhas, sempre vigilante e atento, como um animal em perigo, que lembram (distantemente) Vincent Gallo em Essential Killing (Matar para Viver, 2010); a maneira como a sua máscara de Dafoe se vai desfazendo à medida que se abre e se dá a conhecer às crianças e à mãe (os arranjos na casa: da banheira, símbolo do isolamento, ao gerador, o aparelho que os junta) e, finalmente, põe em causa a vida que leva até aí (com uma subtileza ausente no resto do filme). No entanto, o que salva The Hunter da total irrelevância é o magnífico actor Willem Dafoe (como se poderá deduzir dos pontos positivos que apontei, todos a ver com ele).
Dafoe como que seca as gorduras estilísticas do filme, emprestando gravidade a uma obra facilmente esquecível. Perante aquele rosto, o espectador esquece-se dos time lapses manhosos, da música a puxar ao sentimento, do esquematismo da história, do final xaroposo. Perante aquele rosto, o espectador exaspera-se por não haver realizador que o saiba seguir cegamente. Nem se pedia um grande realizador. Não se pedia um Gus Van Sant, cujo recente Promise Land (Terra Prometida, 2012), na mesma veia ambientalista, é muito mais bem feito (um elogio meio insultuoso, mas um elogio) e inteligente. Se bem que a comparação, pela qualidade dos realizadores, seja injusta.