O cinema de Costa-Gavras sempre foi muito imediato, sempre teve o desejo de retratar o agora e sempre o fez em formato de denúncia ou parábola. Os seus primeiros filmes tinham a primeira intenção, dar um olhar diferente sobre acontecimentos recentes acompanhando uma história particular, penso em Z (Z – A Orgia do Poder, 1969) sobre os período antes do golpe militar que iniciou a ditadura dos militares na Grécia (país de origem do realizador) ou em Missing (Missing – Desaparecido, 1982) sobre as atrocidades do golpe de estado de Pinochet e da complacência americana com a mortandade (qualquer semelhança com a realidade é propositada).
Mais recentemente o formato tem sido outro, a parábola. Pensamos no circo mediático de Mad City (Cidade Louca, 1997) em que tudo é esquemático na apresentação [espécie de remake de Ace in the Hole (O Grande Carnaval, 1951) de Billy Wilder] ou mais recentemente em Le Coupret (Golpe a Golpe, 2005) onde, de novo, nos é apresentada uma fábula para adultos – o desemprego – ou Eden à l’Ouest (Paraíso a Oeste, 2009) – a emigração ilegal. Independentemente disto o que caracteriza o cinema de Costa-Gavras é o seu peso: nunca conseguirá ser delicado na forma. Tendo isso em conta olhamos para o mais recente filme, Le Capital (O Capital, 2012), que como o título avisa trata sobre o mundo do capital e como seria de esperar está algures entre a denúncia e a parábola.
Parábola porque tenta dar-nos um olhar sobre mundo da alta finança através de uma voz off demasiado consciente do espectador (Gad Elmaleh olha várias vezes para a câmara e fala directamente connosco que estamos do lado de cá, como que nos implicando nos crimes e falcatruas que irá fazer ao longo do filme); denúncia porque se pretende dar a ver o sistema financeiro por dentro com as tricas e intrujices de cada um dos intervenientes: as chantagens, as manipulações, os testas de ferros, os offshores, os inside tradings e poderíamos continuar com os anglicismos.
E talvez seja esse o maior problema do filme, estar embasbacado com toda a panóplia de opções financeiras para a trafulhice, aqui há de tudo, muitos telefonemas para aqui e para ali, vídeo-chamadas, vídeo-conferências, mensagens, swaps especulativos e exóticos, downsizings, layoffs e deslocalizações, dividendos devidos e indevidos, enfim um bouquet selvagem de opções capitalistas. E nessa fúria de ser actual Gavras fica-se apenas pelo imediato, pelos gadgets informáticos e pelas expressões que facilmente ficam no ouvido. Sente-se que Gavras não faz a mínima ideia do que está a filmar, aquele mundo é-lhe incompreensível (como é à grande maioria da população mundial e à personagem do tio revoltado que corporiza aquilo que conhecemos do realizador) e portanto fixa-se no fogo de artifício que é o espectáculo especulativo.
No final do filme ficamos com ideia de que não percebemos mais sobre aquele mundo, nem sobre aquelas pessoas, do que já sabíamos à partida. Gavras faz um filme cujo lema poderia ser aquele comentário político muito esclarecedor: “são todos uma cambada de ladrões, de gatunos e de chupistas” e fica contente por expor este segredo avassalador.
Felizmente temos tido quem olhe para a crise e pense sobre ela em filme (e não é com certeza o senhor Oliver Stone), penso em Steven Soderbergh com Magic Mike (2012) e The Girlfriend Experience (Confissões de Uma Namorada de Serviço, 2009) ou em J. C. Chandor com Margin Call (O Dia antes do fim, 2011) ou até em António da Silva com Bankers (2012) e no último Almodóvar.