Se alguma vez o fez, o DocLisboa há muito deixou de se ater ao cinema documental. Em primeiro lugar, porque a definição de documentário é cada vez menos rígida, incluindo desvios e heterodoxias (heresias), penetrando por vezes até mesmo no território da ficção. Em segundo, porque a própria programação do festival lisboeta não exclui a ficção pura e dura. Nesta décima terceira edição, mantém-se, ainda assim, a preocupação social, ou melhor, a atenção pelo que vai acontecendo na sociedade, pela actualidade, pelos temas do momento (não é por acaso que uma das secções se chama “Cinema de Urgência”). Esse cariz “político” do Doc, interventivo e historicista, será a sua característica mais distintiva, demarcando-o dos demais festivais.

Ora, esta ideia cimenta-se percorrendo o olhar pelas várias secções do festival, a começar pela retrospectiva “I don’t throw bombs, I make films”, sob as representações do terrorismo no cinema. Cinema político, portanto, tanto no sentido estrito como no lato. Documentários e ficções sobre os grandes movimentos terroristas (ou activistas mais ou menos extremistas) dos anos 60 e 70 – IRA, as Brigadas Vermelhas, o Grupo Baader-Meinhof – realizados por nomes consagrados como Rainer Werner Fassbinder, Margarethe von Trotta, Kôji Wakamatsu, Hartmut Bitomsky e Bernardo Bertolucci. A outra grande retrospectiva do DocLisboa, do realizador sérvio Želimir Žilnik (que já está em Lisboa), cuja filmografia foi censurada nos tempos da ex-Jugoslávia, presume-se, por ser demasiado crítica do regime de Tito, preserva essa veia política, contestatária. A retrospectiva decorrerá integralmente nas salas da Cinemateca Portuguesa.
Outra secção preocupada com questões sociais e inteiramente despreocupada em relação a qualquer definição estrita de documentário é “Riscos”, pela última vez sob alçada de Augusto M. Seabra. Na conferência de imprensa de apresentação do festival, Seabra destacou, de entre os filmes escolhidos por si, o foco dado à dupla Nicolas Klotz (realizador) e Elisabeth Perceval (argumentista), de que serão mostrados três filmes. O mais conhecido talvez seja La question humaine (2007) com Mathieu Amalric. Mas também haverá obras de José Luis Guerín, Ben Rivers e Boris Lehman.
Nas competições, tanto a internacional como a nacional, será introduzida uma novidade interessante: as curtas-metragens e as longas passarão a estar em posição de igualdade, acabando o apartheid costumeiro neste tipo de eventos. Deste modo, uma curta de Manuel Mozos concorre directamente com uma longa de Billy Woodberry ao prémio principal. Na Competição Internacional, destacam-se, à partida, O Futebol (2015) de Sérgio Oksman, Bella e perduta (2015) de Pietro Marcello (a sessão de abertura), And when I die, I won’t stay dead (2015) do referido Woodberry, A Distant Episode (2015) de Ben Rivers e A Glória de Fazer Cinema em Portugal (2015) do português Manuel Mozos. Quanto à Competição Portuguesa, Portugal – Um Dia de Cada Vez (2015) de João Canijo e Anabela Moreira e Acorda, Leviatã (2015) de Carlos Conceição, serão os mais reconhecíveis. Contudo, os filmes mais aguardados (ou os nomes mais sonantes) encontram-se Fora de Competição. À cabeça, No Home Movie (2015) da recém-falecida Chantal Akerman, mas também In Jackson Heights (2015) de Frederick Wiseman e Sobytie (The Event, 2015) de Sergei Loznitsa.
Resta ainda o “Heart Beat”, dedicado à música (ou mais genericamente ao espectáculo). Nesta secção, haverá espaço para indivíduos cuja importância é inegável como Robert Wyatt, Frank Zappa, Ornette Coleman, Marlon Brando ou o guitarrista português Phil Mendrix assim como para movimentos artísticos, caso do cinema nova-iorquino dos anos 80 em Llik your Idols (2007) de Angélique Bosio, ou trabalhos de recolha musical, como o de Tiago Pereira e o seu A música portuguesa a gostar dela própria em Porque não sou o Giacometti do Século XXI (2015) realizado pelo próprio.
A programação do DocLisboa, que decorrerá entre 22 de Outubro e 1 de Novembro, na Culturgest, no Cinema Campo Pequeno, no Ideal, no São Jorge e na Cinemateca, pode ser consultada no site do mesmo. No Facebook do festival, descobrem-se também a sugestões de todos os colaboradores, pequenos guias para quem ainda não escolheu o que ver.