Introdução à Segunda Temporada dos Filmes Fetiche
Os filmes de Hong Sang-Soo são extraordinários pela simplicidade de meios em que são concebidos, e pela forma singela com que este procura realçar o desejo, que nos é intrínseco, de comunicar. É um conhecedor exímio da mecânica de como contar uma estória, encaixando as suas criações umas sobre as outras que nem bonecas russas, e porventura aqui próximo de Rohmer. Assume a repetição como um gesto lapidar na construção fílmica, uma deriva que leva a exploração e gera conhecimento de novos elementos, amplificando assim o mundo real-fantasia em que os seus personagens (ou os vários Hong’s) se encontram. Personagens essas extremamente cinematográficas, banalmente humananas, com a capacidade de fazer da realidade um jogo, uma construção cómico-trágica, que os faz vaguear sem sentido proporcionando encontros inesperados.
Autênticas mise en abyme, a repetição que nos leva de um filme a outro e a outro, universos fílmicos que ecoam uns sobre os outros, formas sobre formas que se vão criando e que renascem mais tarde sobre outras formas, ideias, lugares e uma confusão de sentimentos.
Vejamos o ato de fumar nos filmes de Hong – intervalar cinemático, evento rotineiro, onde o fumo em cadeia dá espaço a estes personagens para que possam “respirar”, de novo, de si mesmos e das situações triviais dos seus dia- a-dia. Fumar é assim um ato que tem tanto de seco, disruptivo, como de vital. A habilidade de Hong em criar estes momentos quase microscópicos, faz com que este nos consiga desarmar perante coisas que as vezes pensamos serem impossíveis de estarmos a sentir.
Nuno Gonçalves