A 15 de Novembro de 1958, em Madrid, morre Tyrone Power, um dos maiores galãs de Hollywood dos anos 30 e 40. Indirectamente, esta morte iria afectar de forma significativa a carreira de um outro galã mais modesto, o português Virgílio Teixeira. Power estava em Espanha desde Setembro para a rodagem de Solomon and Sheba (Salomão e a Rainha de Saba, 1959), realizado por King Vidor, onde interpretava o protagonista. Com dois terços do filme já rodados, a morte de Power ameaçou cancelar o projecto, mas Yul Brynner acabaria para ser contratado para refilmar o papel de Power. Virgílio Teixeira havia participado na primeira rodagem, interpretando um papel secundário onde contracenava com Power e Gina Lollobrigida, mas já não participara nas refilmagens com Brynner, desaparecendo assim do filme, o que representou um enorme revés na internacionalização da sua carreira de actor.
Nascido na atlântica cidade do Funchal, em 1917, Virgílio Teixeira rumara para Lisboa com o sonho de vingar como actor de cinema. Começou em 1942, como figurante em Costa do Castelo, de Arthur Duarte, e três anos mais tarde conquistava o Prémio do SNI para Melhor Actor pela interpretação do bandoleiro José do Telhado no filme homónimo de Armando de Miranda. O seu apogeu aconteceria em 1947, quando se juntou a Amália Rodrigues como o par romântico de Fado, História d’uma Cantadeira (1947), de Perdigão Queiroga. Entretanto, Teixeira começa também a ser figura visível no cinema espanhol. Participaria em cerca de 50 filmes, entre os quais Agustina de Aragón (1951), de Juan de Orduña, que lhe valeu o prémio de Actor Mais Popular de Espanha atribuído pela revista Cine-Mundo.
Virgílio Teixeira haveria de permanecer pouco tempo em Hollywood: “É muito dura, a vida em Hollywood. Droga por todo o lado, sobretudo cocaína. Tive medo. Ofereceram-me droga, acho que era haxixe. Achei que o melhor era ir embora e fui para Espanha.” Haveria de manter uma relação com Hollywood através de Espanha, concretamente através das “runaway productions”, as megaproduções épicas de Hollywood rodados no estrangeiro por questões orçamentais. Espanha foi um dos destinos mais populares para estas produções a partir de final dos anos 50: o produtor Samuel Bronston foi o responsável por nomes como Anthony Mann, Nicholas Ray, Charlton Heston, Sophia Loren, Ava Gardner, John Wayne ou Rita Hayworth terem filmado no país vizinho.
Como a generalidade dos latinos, Virgílio Teixeira viu-se condicionado aos estereótipos mais recorrentes, nomeadamente aos papéis secundários com poucos diálogos ou a meras figurações quando os filmes se ambientavam na Antiguidade Clássica ou em algum território exótico. Foi nesse registo que conquistou os primeiros papéis: interpretou Ptolomeu em Alexander the Great (Alexandre o Grande, 1956), de Robert Rossen, e um marinheiro Ali em The 7th Voyage of Sinbad (A 7ª. Viagem de Sinbad, 1958), de Nathan Juran. Voltaria a trabalhar com Anthony Mann em The Fall of the Roman Empire (A Queda do Império Romano, 1964), onde interpretaria Marcellus, um centurião de Marcus Aurellius. Antes, havia interpretado Cayetano, um toureiro mulherengo amigo do protagonista de The Happy Thieves (Alegres Ladrões, 1961), de George Marshall.



Igualmente exótico para Hollywood, o nome do actor haveria de aparecer grafado de forma errada ao longo dos filmes que foi fazendo para produtores norte-americanos, geralmente Texeira ou Texera. Por isso mesmo, para facilitar a socialização, haveria de ficar conhecido em Hollywood como Tex. Noutros casos, como aconteceria com El Cid (1961) de Anthony Mann ou Doctor Zhivago (Doutor Jivago, 1965), o seu nome não seria sequer creditado no genérico do filme.


Em 1966, a carreira de Tex em Hollywood conheceu o seu momento mais mediático, dando corpo a Luís Delgado, um dos novos 7 Magníficos na sequela realizada por Burt Kennedy. Em Return of the Seven (O Regresso dos 7 Magníficos, 1966), Tex interpreta um criminoso mexicano condenado por homicídio que aguarda o enformamento, Luís acede à chamada de Yul Brynner e Robert Fuller, dois dos 7 Magníficos originais, para proteger uma humilde aldeia mexicana do temível vilão Lorca. A condição de co-protagonista garantiu-lhe várias cenas fotogénicas a cavalo, onde se valeu da experiência adquirida no já citado José do Telhado e em Ribatejo (1949), o “western ribatejano” realizado por Henrique Campos.
Depois de Return of the Seven, Tex faria mais dois papéis em produções internacionais: o marinheiro Decrees na co-produção espanho-italo-francesa Il grande colpo di Surcouf (Tempestade Sobre o Índico, 1966), de Sergio Bergonzelli e Roy Rowland; e o General Carillo em The Magnificent Two (Os Dois Magníficos, 1966), de Cliff Owen, uma comédia britânica ambientada numa Venezuela às voltas com uma revolução. Inesperadamente, o galã abandonaria o cinema no auge da sua carreira. De volta à ilha da Madeira, aí permaneceria por quase uma década sem filmar (1967-1976).
Apesar de António Vilar surgir nas histórias do cinema português como o mais internacional dos actores portugueses, a passagem de Virgílio Teixeira pelas produções de Hollywood faz com que o madeirense tenha trabalhado de forma recorrente ao longo de uma década na indústria cinematográfica mais concorrida do mundo. Ao contrário de Vilar, que se tornaria no rosto do cinema do Estado Novo ao encarnar vários heróis nacionais em adaptações históricas feitas no cinema português ao longo dos anos 40, desde D. Pedro (Inês de Castro (1944) de Leitão de Barros, e D. Dinis em Rainha Santa ( 1947) de Rafael Gil), até Camões (1946), o maior de todos os portugueses, no filme homónimo de Leitão de Barros, Virgílio Teixeira sempre manteve uma distância das esferas do poder. Participaria, isso sim, e sem cobrar cachet, das aventuras neo-realistas de Manuel Guimarães que tanto desagradavam ao SNI e à censura fascista, nomeadamente na primeira rodagem de Vidas sem Rumo (1956) e do anti-épico Nazaré (1952).
Nas décadas seguintes, Virgílio Teixeira haveria ainda de aparecer fugazmente pelos ecrãs de cinema, concretamente na última obra do também madeirense Jorge Brum do Canto [O Crime de Simão Bolandas (1984)] e n’A Mulher do Próximo (1988), de José Fonseca e Costa. Seria, no entanto, noutro ecrã que haveria de ter um último apogeu mediático: integraria o elenco principal de Chuva de Areia (1985), uma das primeiras telenovelas portuguesas, no tempo em que as telenovelas eram escritas por Luís de Sttau Monteiro e atraíam estrelas consagradas do teatro e do cinema como Mariana Rey Monteiro, José Viana e Laura Soveral ou os improváveis José Fonseca e Costa e António Lopes Ribeiro.
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