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Cléo de 5 à 7 (1962) de Agnès Varda

De Carlota Gonçalves · Em 26 de Dezembro, 2017

Cléo de 5 à 7 (Duas Horas na Vida de uma Mulher, 1962) é um filme bem amado que cabe na lista dos melhores, pelo olhar da gigante Agnès Varda que agarrou num tema peculiar, doença e morte anunciada, para fazer dele uma bela e intensa flânerie pela cidade de Paris. Realizado na época e no espírito da Nouvelle Vague (Varda não integrava o grupo dos Cahiers du cinéma), Cléo de 5 à 7 revela-se de forma singular por uma voz feminina, raro na altura, que se vai muito bem fazer ouvir, contando ainda com os típicos reflexos da época que toma o cinema em mãos para lhe traçar novos caminhos, em fuga do reiterado classicismo. Varda era discreta e livre, não tinha as referências cinéfilas do grupo, tinha feito a longa La Pointe Courte (1955), filme classificado pré-Nouvelle Vague, rodado em décors naturais, com baixo orçamento. Foi a primeira cineasta a dizer que era preciso rodar depressa, sem muito dinheiro, e com toda a liberdade de expressão. Varda tinha ainda realizado algumas curtas, visto poucos filmes, não tinha passado pela teoria e crítica de cinema, e possuía a inocência do olhar, uma forma de isenção que lhe acrescentava frescura, e claro, liberdade.

Cléo de 5 à 7 foi fulgurante e veio para ficar, na época chamou a atenção o tema da doença – cancro – que a protagonista carrega o filme inteiro, porque é um assunto novo tratado com uma leveza e um sentido inesperado. O filme funciona através dos múltiplos sinais que se vão espalhando ao longo da narrativa e pelas dicotomias presentes: superfície e profundidade, luz e sombra, leveza e densidade, preto e branco. O título é logo sugestivo e projecta imediatamente a imagem de um possível affaire amoroso com hora marcada, amor de tarde, provavelmente ligeiro, malandro, e medido temporalmente ao minuto. Aliás, o filme é logo na construção bem claro na importância atribuída à contagem do tempo e à organização estrutural que o comanda.

Está dividido em 13 capítulos que anunciam por escrito a duração que cada um tomará. Varda é obsessiva com o tempo, os relógios circulam, desde a colecção que Cléo tem no seu apartamento, a todos os relógios que discretamente vão surgindo pela cidade. O tempo urge, corre, Cléo mergulha numa contagem implacável. O filme foi rodado cronologicamente, coisa incomum no cinema, o tempo real tinha que ser a pedra de toque deste relato de uma 1h30.

Cléo de 5 à 7 começa com um genérico e prólogo a cores, alternado por imagens a preto e branco. Cléo, uma cantora de algum sucesso, recorre a uma cartomante de Tarot para saber o futuro, amedrontada pelo resultado de exames médicos que podem anunciar a receada doença. O medo rompe ali com as figuras temidas, representadas no jogo do acaso, permitindo uma leitura que parece óbvia à heroína, a verdade terrível de um fim anunciado.

A rua recebe Cléo, o café, as lojas, o táxi, a mecânica do bulício de uma capital em movimento exibe-se na modernidade das imagens de Varda, que aponta a câmara para o mundo que envolve a sua personagem. A cidade acolhe Cléo, e Varda filma-as – cidade e personagem – dentro da sua veia experimental e com a sua enorme substância documental – o mundo está ali em trânsito a marcar o passo. Paris ressurge, boémia, veloz, a imagem da cidade acompanha a agitação de Cléo, funde-se com ela, também é ela. A actriz Corinne Marchand é Cléo, uma mulher bela, grande, voluptuosa, um corpo vivo e saudável, onde não há traços de doença ou de definhamento. Varda preferiu a visibilidade da beleza pois para ela: “representa bem o tema magistral de toda a vida, e de toda a pintura, a beleza e a morte (…) o tema é melhor tratado tendo uma mulher bela e carnal, a real beleza, a carne da vida, face à ameaça da morte sempre representada por um esqueleto.” Foi de grande inspiração para Varda o pintor renascentista alemão Hans Baldung Grien e a sua temática de eleição, erotismo e morte, na figuração de mulheres plenas de sensualidade enlaçadas por esqueletos – Eros e Thanatos emergem num esquema pictórico descarnado, onde beleza e morte encetam o seu eterno diálogo.

O apartamento de Cléo é também um décor extraordinário, amplo, moderno, com uma decoração teatral que parece pertencer às histórias encantadas, onde há baloiços e asas na parede, camas de princesa, gatinhos, cortinas, e muitos espelhos. Já a cidade também é um vasto espelho a reenviar imagens, a criar reflexos e mais reflexos que se multiplicam e recriam em mais imagens dentro umas das outras. Há uma vontade de realismo para marcar o compasso desta espera de um tempo que não se cala, a rádio emite notícias, desde o novo champô de uísque, a recuperação de Piaff, à guerra da Argélia, a informação corre. Varda gosta sempre de colocar o mundo real dentro das histórias, de o fazer comunicar com o outro que na verdade também é real, o real fabricado que joga com o tempo objectivo e subjectivo que a realizadora quis pôr lado a lado.

O tempo não pára e lembra o caleidoscópio de Walter Benjamin como modelo teórico que coloca em questão a estrutura do tempo, sob o ponto de vista de um desmoronamento interior. Conceito que se explica pelas próprias matérias que fazem parte da construção do objecto, a ver o que é disposto no tubo entre os vidros: restos de tecidos, conchas minúsculas, pedaços de plumas ou poeiras de toda a espécie. Estes materiais serão como peças do mundo exterior de Cléo que contactam com o interior e fazem ver, primeiro de fora para fora, e depois de dentro para fora. Provavelmente, perto da ideia de fragmentos que se vão compondo, recompondo, como um caleidoscópio, recriando novas imagens em jogo permanente, e a vibrar com a sensação do tempo.

Varda diz que, nos primeiros 45 minutos, Cléo é olhada, desejada, é um objecto de prazer, e nos restantes 45 é ela que olha, passa a ‘’ver’’, nesta função do olhar. Varda acrescenta ser este também um acto feminista: “O primeiro acto feminista de uma mulher, é o de olhar/ver, de dizer ‘certo, olham-me mas eu também olho’“.

Depois de um ensaio com os músicos – Michel Legrand, além de assinar a música, tem um pequeno papel como pianista – Cléo canta Sans toi, momento que Varda destaca isolando a actriz na imagem em fundo negro, numa expressão estética carregada de drama, momento em que a imagem, a música e a voz entram em fusão, na ordem de um qualquer realismo fantástico, dilacerante.

A partir daqui, Cléo rompe com a personagem de charme, tira a peruca, muda de vestido, agora é negro, e volta para a rua. Cléo começa a ver tudo, vê pessoas, ouve conversas, fala-se de surrealismo, poesia, de Picasso, Miró… O périplo continua, a personagem entra num atelier de escultura ao encontro da amiga Dorothée (Dorothée Blanck), modelo nu, e conta-lhe que está doente – um espelho de bolso vai partir-se, sinal declarado, parece já não haver espaço para falsas aparências. Há também o delicioso filme burlesco Les fiancés du pont Mac Donald (1961), com Godard a tirar os óculos de sol  (Varda, conta, fez o pequeno filme para mostrar os olhos bonitos de Jean-Luc), Anna Karina e outros actores amigos, que a realizadora coloca estrategicamente para aligeirar o tom.

E chega a cena no parque Montsouris, o encontro com Antoine (Antoine Bourseiller), o soldado em licença, o acaso está ali mesmo, entre as árvores e as águas que correm, e como golpe de magia elimina o mundo para os deixar a sós, numa outra errância, a da palavra fácil, da confissão sem peso, da conversa que sai sem nenhum esforço. Ele preferia morrer de amor do que morrer na guerra, ela tem muito medo de tudo e tem medo da morte, e estão os dois no mesmo barco. O efeito de um filtro verde colocado na captação a preto e branco vai dar à relva um tom branco, límpido, e criar contrastes na imagem que desenvolvem uma atmosfera de sonho. Os dois apanham um autocarro – é mais divertido o autocarro que o táxi, dirá Antoine – rumo ao hospital Salpêtrière, lembremo-nos que a contagem do tempo não pára; há um rápido encontro com o médico que fala do tratamento de Cléo, os dois caminham depois para nós, não sabemos exactamente o destino de cada um: sobreviverá ele à guerra da Argélia? Escapará ela à doença?! Não importa porque Varda tratou tão bem o filme, o tema, a personagem, que tudo fica dentro de um mundo de cinema, raro, especial. Continua, Agnès Varda, a fazer a dança do cinema (como aconteceu na recente homenagem ao receber o Óscar honorário em LA). Bravo!

Este texto continua a rubrica Cinema em Casa onde regularmente o À pala de Walsh fará os destaques de lançamentos DVD/Blu-Ray /VOD no mercado nacional. Cléo de 5 à 7 pode ser visto em streaming na mais recente plataforma de VOD nacional, o Filmin. O À pala de Walsh, em colaboração com o Filmin, dá a possibilidade ao leitor de se habilitar ao acesso temporário à plataforma de forma a ver o filme. Cléo de 5 à 7 está acessível para visionamento na plataforma streaming Filmin. 

Para se inscrever no sorteio de dez códigos que temos para oferecer, basta que partilhe nas redes sociais o link desta crítica e envie um mail para apaladewalsh@gmail.com com o seu primeiro e último nomes e a resposta à seguinte pergunta:

Diga o título do primeiro filme de Agnès Varda, obra de 1955 considerada por muitos o primeiro filme da Nouvelle Vague.

As inscrições estão abertas até 23h59 do próximo dia 7 de Janeiro e o resultado do sorteio será anunciado no dia seguinte com base na distribuição aleatória do sítio Random.org.

Boa sorte!

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Carlota Gonçalves

"I seem to remember you from one of my dreams. One of the better ones." – Murder, My Sweet (1944) de Edward Dmytryk

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