O Paulo [Rocha] contava que, durante a rodagem do ‘Mudar de Vida’, recebia alguns diálogos e ficava maravilhado, que eram extraordinários, e que, se havia alguma coisa a mudar, era só uma palavrinha ou outra. Mas que chegavam muito atrasados, e que o Reis vinha entregá-los à rodagem. Contava também que, por vezes, viam um homem pequenino ao longe, na sua bicicleta. O Reis era baixinho. Naquele plano das salinas em que passa uma mulher com um lenço e que parece uma egípcia, o Paulo dizia “não é fantasma nenhum, o António andava por ali, com a sua bicicleta, andou sempre atrás de nós, em todos os cenários, a espreitar, ele queria saber como é que a gente fazia cinema, mas tinha vergonha.” E era muito possível, o António era assim.
Pedro Costa, “«Talvez fosse uma loucura, talvez começasse a escavar outro filme nesse filme…». Entrevista com Pedro Costa sobre o restauro de Os Verdes Anos e Mudar de Vida, de Paulo Rocha”, Aniki, v. 6, n. 1, 2019.