Realizadoras soviéticas > Lana Gogoberidze > Waltz on the Petschora (1992) > “Tbilisi occasion celebrates filmmaker Lana Gogoberidze, Georgian Cinema History” > Nutsa Gogoberidze > ბუბა/Buba (1930)
To discover the history of women and art is in part to account for the way art history is written. To expose its underlying values, its assumptions, its silences and its prejudices is also to understand that the way women artists are recorded is crucial to the definition of art and artist in our society
Rozsika Parker, Old Mistresses: Women, Art and Ideology, 1981
Vozes silenciadas, visões esquecidas. Lugares do cinema sem espaço, que pairam num vazio imposto por paradigmas do passado: um discurso perdido, um diálogo por encontrar.
O caminho do reconhecimento passa pela procura, pela vontade de desvendar os segredos – as imagens, os sons, as paisagens, os indivíduos – que se encontram nas margens.
Enquanto meros espectadores, consumidores, observadores, nem sempre obtemos as pistas necessárias para contornar o óbvio reconhecido, nem sempre obtemos as respostas necessárias para preencher os vazios (que exclamam, que gritam, mas que se encontram) perdidos na – nossa tão comunitária, tão pessoal – viagem pelo mundo dos olhares.
Partimos, agora, para uma aproximação, para uma (re)construção da memória: essa memória que se instala a cada instante, em cada frame; de uma reflexão – visual – que se perdeu no (nosso, no meu) discurso, pelo poder do desvio normalizado vigente.
Partimos, agora, para a vastidão das paisagens da Geórgia – tão distantes, tão próximas -, para um universo imagético e social carregado de contrastes – naturais, geológicos, comunitários, individuais. Aqui, nasceu, cresceu – e estabeleceu-se – um dos primeiros registos de Nutsa Gogoberidze: Buba (1930). Um poema documental, dividido em cinco capítulos, que nos apresenta a rotina, a dinâmica de uma comunidade rural no norte da Geórgia.
Da elevação, da observação de quadros e pinturas que compõem o interior de uma catedral, somos conduzidos à observação da magnânima paisagem que constrói o ambiente de vivência da comunidade: uma imagem do poder natural, do esplendor do movimento – quase surrealista -, da força – quase imobilizadora – dos elementos.
Nesta imagem, encontramos os indivíduos, encontramos a rotina, as práticas de trabalho nas suas mais diversas formas: lavrar, tear, pastar, lavrar, tear, pastar, pastar, tear, lavrar. A intensidade laboral é reflectida pela montagem frenética – com uma velocidade (quase visualmente) incapacitante -, de imagens que se repetem regularmente, mas que, a cada passo, nos providenciam pistas, ideias sobre a vida nesta vila marcada pela dureza da vida.
As dificuldades não reinam, no entanto, neste campo: pelas elevações montanhosas, pela vila, pelo interior de habitações – precárias -, temos vislumbres do potencial humano comunitário. O olhar sobre esta realidade é terno, e encontra – e ressalta – a beleza, a poesia. A união é a base que prevalece.
Os contrastes são conjugados, sobrepostos: a separação entre o humano e o natural é eliminada e uma só imagem prevalece. A brutalidade é indissociável da harmonia; a fluidez dos corpos que dançam é inseparável das correntes dos rios; os ventos que conduzem as nuvens são os gestos que embalam a criança que chora à procura de conforto maternal.
Mas a (real) poesia das imagens ressalta do foco do olhar: aqui, observamos todos os elementos que constroem a comunidade, a paisagem: os homens, as mulheres, as crianças, os idosos. Aqui, encontramos um lugar para aqueles que não tinham – e ainda hoje, por vezes, não têm – um lugar no espaço social, no espaço cinematográfico, sem uma linha de destaque pela separação. Aqui, a união faz a poesia, o olhar faz o cinema.
Desbravar o caminho para o reconhecimento parte pela exploração desta – e de outras – vozes silenciadas, visões esquecidas. Esta é uma primeira pista, este é um primeiro passo. O caminho para a criação de um espaço comum – sem linhas de separação de margens, de nichos – passa agora, aqui, por cada um de nós.
Nutsa Gogoberidze realizou três filmes, tendo sido a primeira realizadora soviética a criar uma longa-metragem de ficção. O seu caminho no mundo do cinema foi curto: após ter sido exilada durante uma década, trabalhou no Centro de Linguística de Tbilisi, nunca mais regressando ao universo cinematográfico.
Encontrar os seus registos cinematográficos não é uma tarefa fácil: Buba (1930), a sua segunda obra, é o único registo que pode ser encontrado em arquivos online. A sua longa-metragem de ficção – potencial alvo de destaque – raramente é exibida, após ter sido alvo de censura na época em que foi produzida. A sua obra foi colocada nas margens do discurso dominante, e aí permaneceu por um longo período de tempo. Urge a (re)descoberta da sua obra: urge uma maior visibilidade, a criação de um discurso frequente e consistente sobre este olhar.
> Radunovic, Dusan (2014) ‘Incommensurable distance : Georgian cinema as a (trans)national cinema.’
> Biografia
> Lana Gogoberidze (realizadora, filha de Nutsa Gogoberidze) e Salome Alexi (realizadora, neta de Nutsa Gogoberidze)