Até 1958, com a chegada de César Moreira Baptista à direcção do Secretariado Nacional de Informação (SNI), não havia qualquer estratégia de circulação de filmes pelos festivais de cinema europeus. No fundo, a presença de filmes portugueses dependia muito do dinamismo dos seus produtores ou distribuidores, que apostavam sobretudo na presença em festivais para rentabilizar comercialmente o filme e tentar vendê-lo para mercados estrangeiros.
Uma das excepções aconteceu a propósito da participação de Portugal no Festival Internacional de Cinema do Brasil, em 1954. Dada a importância histórica desse evento, o SNI organizou a presença portuguesa e a delegação que viajaria, optando pela escolha da longa-metragem O Cerro dos Enforcados (1954), de Fernando Garcia, sobretudo por adaptar um conto de Eça de Queiroz.
Outra das excepções aconteceu no Festival de Cannes de 1959, quando Portugal apostou fortemente na apresentação de Rapsódia Portuguesa, uma realização de João Mendes e escrita por Fernanda de Castro a partir de uma ideia de António Ferro. A presença deste filme em Cannes foi acompanhada por uma significativa operação de marketing que incluía oferta de brindes (barretes de campinos, chinelos e vinho do porto), figuração folclórica, publicidade nos jornais locais e a preparação de uma importante delegação com a presença de Amália Rodrigues e António Vilar.
Em Julho e Outubro de 1961, o SNI enviou a diversos festivais de cinema internacionais uma nota oficiosa que esclarecia os organizadores que, ao abrigo do Decreto-lei 31.134 (de 24 de Novembro de 1944), qualquer participação de filmes portugueses em eventos cinematográficos internacionais terá de ser mediada pelo SNI. De acordo com o diploma, no seu artigo 19.º, “a exportação de filmes portugueses para o estrangeiro” dependia “de autorização do Secretariado, do seu parecer favorável ou da aprovação prévia dos argumentos e elencos técnicos e artísticos”.
Durante essa década, a participação oficial de filmes portugueses em festivais de cinema intensificou-se e diversificou-se por vários países, nomeadamente Itália (Bérgamo, Génova, Trento, Veneza, Florença, Cortina D’Ampezzo, Salerno, Milão, Trieste, Tirrena, Roma, Novara e Pádua), França (Cannes, Paris, Tours, Rolle, Marselha, Asniéres e Carcassone), Espanha (San Sebastian, Valladolid, Bilbau, Barcelona, Santander, Benidorm, Corunha, Saragoça, Múrcia, Le Felguera, Cala D’Or), a antiga República Federal Alemã, (Berlim, Manheim e Salzgitter), Canadá (Vancouver), Austrália (Sidney e Melbourne), Bélgica (Bruxelas, Antuérpia e Ostende), EUA (San Francisco e Los Altos Hills), Escócia (Edimburgo), Irlanda (Cork), Japão (Tóquio), Áustria (Viena), México (Cidade do México e San Angel), Suíça (Genebra e Nyon), África do Sul (Durban e Bleomfontein), Andorra, Colômbia (Cartagena), Brasil (Rio de Janeiro), Inglaterra (Londres e Oxford), Suécia (Estocolmo), Uruguai (Montevideu), Argentina (Mar del Plata), Chile (Santiago) e Paquistão.
Para além destas participações oficiais, contam-se outras participações feitas à margem do SNI, por iniciativa dos produtores ou realizadores: a participação de O Pintor e a Cidade (1956) de Manoel de Oliveira em Cork (Irlanda); a participação de Os Verdes Anos (1963) de Paulo Rocha em Locarno (Suíça, onde venceu o prémio Vela de Prata para melhor primeira obra) ou Acapulco (México, onde reencontraria Glauber Rocha); a participação de Belarmino (1964) de Fernando Lopes em Pesaro (Itália); a participação de Mudar de Vida (1966) de Paulo Rocha em São Paulo (Brasil); a participação de Nojo aos Cães (1970) de António de Macedo em Bérgamo (Itália).
No início da década de 1970, goradas todas as expectativas de triunfar comercialmente no mercado interno, o circuito cinematográfico internacional surgiu como uma forma de viabilização económica e de legitimação artística para o Novo cinema português, que apostou definitivamente pelo caminho de internacionalização.
Não foi portanto estranho que, reconhecendo a importância da recepção crítica internacional, uma das preocupações do Centro Português de Cinema (CPC), e posteriormente do Instituto Português de Cinema (IPC), passasse pela aposta na internacionalização de um certo cinema português, organizando mostras e sessões de divulgação de autores portugueses de referência. Mais do que as presenças nos principais festivais internacionais – que dependiam sempre da “boa vontade“ dos júris de seleção, raramente recompensavam os custos das representações e poucas menções ou prémios conquistavam –, o CPC decidiu apostar na promoção e divulgação em iniciativas não-competitivas e massificada das suas produções, nomeadamente mostras e ciclos.
A primeira experiência mais significativa foi a organização, em Nice, com a colaboração do festival cinematográfico local, da Semaine du Jeune Cinema Portugais em Março de 1972: uma seleção de filmes que incluía produções recentes do CPC, filmes das Produções António da Cunha Telles, filmes de João César Monteiro, António Campos, Cunha Telles e Rogério Ceitil (que ainda não pertenciam à cooperativa), e uma retrospectiva apreciável de Manoel de Oliveira. Mais do que uma simples mostra, esta iniciativa deu uma visibilidade mediática ao Novo Cinema Português no mercado internacional que nunca tinha tido até então, justificando o elevado investimento por parte do CPC na sua organização.
O sucesso foi tal, do ponto de vista da repercussão crítica e da cobertura mediática, que o CPC voltaria a apostar neste tipo de iniciativas (Barcelona em 1973, Cinemateca Francesa, Paris, em 1974) e o próprio IPC, que assumiria maior destaque após 1974-75, também privilegiou este modelo realizando mostras em Liége (Março de 1977), Poitiers (Abril de 1977), Madrid (Abril de 1977), Londres (Outubro de 1977), Manheim (Outubro de 1977), Amesterdão (Novembro de 1977), Leipzig (Dezembro de 1977) e Orense (Março de 1978).