X (1973) de Barbara Hammer
Numa dança de luta contra a corrente do movimento, manipula-se com um gesto a linha que amarra, que prende. A dor reside na prisão que limita o êxtase do toque no potencial do extenso reino das possibilidades. O social impõe o previsível, o mental vagueia na – secreta(mente) prazerosa – invisibilidade. A tradução do desejo, da vontade no plano da experiência partilhada quebra os limites delineados pelas estruturas firmes desenhadas por mãos desconhecidas. Uma arquitectura de castração rompida pela maleabilidade de um corpo que sente, que toca, que foge. Carregado de simbologias, de significados, de premissas de existências impostas, o ser (res)sente. Carregado pelo peso da corrente, da (inevitavelmente falível) utopia do expectável, o corpo foge do meio que o (tenta) afoga(r).
Não (lhe) pertence.
De espada erguida, segue cega pelo campo das imposições. Esta é a posição de ataque – descontrolada, desenfreada – para protecção contra o inimigo. Não visível, expande-se em formato guerreira improvável contra os ventos que sopram contra a sua maré: não vê [ma(is, ma)s é finalmente vista].
As limitações revelam-se, desde logo, na linguagem. Do grito repetido do “eu”, sente-se a dor de quem existe, de quem persiste, de quem resiste. Dos traumas d(e um)a infância, surgem as pistas para a reformulação do vocabulário do presente. Da incógnita, revela-se a função: o confronto é o conforto, a luta é a salvação.
A fantasia (re)nasce da escuridão das camadas interiores que dão fruto. A carne do ventre expõem-se, eliminando as fronteiras que dão origem à expectativa da fundação do mundo. O controlo é o conforto, a guerra é a redenção.
Habitar em pleno os tecidos que compõem a edificação do humano é a exibição das profundezas, do estado nu da alma. Aqui, a câmara, a luz e o jogo de sobreposição dão espaço à ocupação.
Numa história dominada por narrativas que controlam, que determinam, desde o primeiro momento, o caminho a percorrer, manipula-se com uma imagem as normas que amarram, que prendem. A dor reside na procura constante pela absolvição de pecados da escuridão alheia. Numa vida dominada pela selectividade do esquecimento, o visível torna-se supérfluo. A dor invade o ser que não é visto, que não pertence.
A entrada no domínio do físico exige, talvez, a exposição mais crua: o prazer em bruto.
Neste mundo em que nada é – ou deverá ser – absoluto, assumir o controlo do destino é invadir os espaços (primariamente) ocupados. A ironia reside na naturalidade da perversão das dinâmicas de poder. A resistência está na indeterminação, na fluidez – e contradição – do significado: a fonte da imposição poderá – ou deverá ser – a origem da reversão.
Numa visão, impõe-se um novo normal: a da vivência do invisível num espectro de infinidade material imprevisível. Num filme, impõem-se um novo ser: nasce o prazer de uma vida.