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“Soul”: a vida, a morte e o jazz

De Duarte Mata · Em 18 de Fevereiro, 2021

Soul (Soul – Uma Aventura com Alma, 2020) começa com um plano fechado, o de um rosto sem sorriso, desagradado, confundido, desapontado com o que o se lhe depara em contra-campo. Esse rosto é o de Joe, um professor de música frustrado que conduz, naquele instante, a sua turma desinteressada e pouco dotada (salvo uma ou outra excepção) numa canção clássica de jazz. O tema ensaiado, diz-nos o quadro em segundo plano, é de Mercer Ellington: Things ain’t what it used to be, e não creio que seja uma escolha aleatória. Pois embora o tema seja maioritariamente tocado em versões instrumentais, há uma letra escrita por Ted Persons, cujos 3 primeiros versos parecem-me adequados referir: “Got so weary of bein’ nothin’, / Felt so dreary just doin’ nothin’ / Didn’t care ever gettin’ nothin’, felt so low.” Neles está o melhor sumário possível da opinião que Joe tem da sua própria existência: monótona, insatisfeita, vazia. Mas até Joe, como os dois versos seguintes da canção mostram, poderá ainda avistar uma oportunidade há muito adiada: “Now my eyes on the far horizon can see a glow / Announcin’ things ain’t what they used to be”, o que no filme parecerá, ao princípio, estar representado pela chegada de uma carreira musical onde não sente o seu talento desperdiçado, a qual terá porta aberta graças a uma chamada de um seu ex-aluno. Joe é, portanto, um desses ingénuos que ainda tem um sonho. Mas quando o ensejo surge de realizá-lo, já é tarde, dando por si na stairway to heaven, deixando para trás uma vida inútil. Ou será que não?

Soul (Soul – Uma Aventura com Alma, 2020) de Pete Docter

“Qualquer filme tem de estar apto a ser recapitulado numa palavra”, dizia Truffaut. No caso de Soul, essa palavra é “viver”. Poderá soar a filme de auto-ajuda para alguns, mas, para mim, a habilidade da Pixar é a mesma de Hans Christian Andersen: a de criar fábulas subtis, poéticas, corajosas, emotivas e até filosóficas, onde o registo do conto (ou filme) infantil não é olhado de forma condescendente, mas tornado em forma expressiva de uma visão alegórica sobre o mundo, as relações e a existência humana. Pois se é verdade que as crianças vivem as histórias dos pequenos contos, não menos verdade é que a plena compreensão do verdadeiro significado deles é feita pelos adultos, captando, decifrando e entendendo, sem grande esforço, um jogo delicado de metáforas, parábolas e analogias, percepcionando as várias camadas da obra graças ao conhecimento e experiência pessoal que advêm com o passar dos anos e o respectivo esvaimento da inocência. Em suma, a fantasia não serve para escapar à realidade, mas para iluminá-la. Foi isto que tentei, no passado, apelidar de “génio da Pixar”. E de génio da Pixar é Soul feito. Desde logo porque lida com esse conceito cujas mentes novas ainda não conhecem: o da crise existencial. Depois, porque a causa desta crise está no dilema universal e intemporal de Joe, o qual só se encontra a partir de uma certa maturidade: de um lado da balança, uma carreira idealizada, ambiciosa e preenchida, mas onde estão em falta garantias de segurança e sucesso; do outro, uma indesejada, banal e incompleta, mas fornecedora de conforto e estabilidade. Mas não é tudo.

É também dentro desta amizade que encontro essa capacidade notável da Pixar em abordar temas pesados pelo uso da metáfora.

Olhemos para a amizade entre Joe e 22 (uma alma niilista que rejeita firmemente em nascer). É o novo ramo da árvore genealógica espiritual onde habitam tantas duplas da Pixar, como as de Finding Nemo (À Procura de Nemo, 2003), Up (Up – Altamente, 2009) ou até entre Woody e Forky no ainda recente Toy Story 4 (2019), aplicando-lhes uma fórmula similar na medula: o protagonista, céptico, sério, pouco ou nada impulsivo; e o sidekick, personagem mais solta, cómica e instintiva. É da dinâmica entre estes dois elementos aparentemente antagónicos em termos de personalidade, assim como do objectivo principal do primeiro que acaba por envolver, de alguma maneira, o segundo, que surge uma jornada de auto-descoberta, essa onde o protagonista alcançará uma realização pessoal graças às capacidades transformativas da amizade, passando, no final, a ser uma figura mudada e mais completa do que aquela em que começou. Certo, é Joe quem ensina 22 a querer viver, mas é 22 quem ensina Joe o que é viver, como explicitado no momento mais emocional do filme, aquela doce epifania com Joe a entrar em processo de reminiscência das coisas mais simples (ouvir música com os entes queridos, sentir a calma das ondas à beira-mar, apanhar uma folha outonal trazida pela brisa da tarde), começando com eventos da Terra em grande plano, acabando com a Via Láctea em plano geral, sequência sugestiva do estado de compreensão e aceitação, do particular ao cósmico, da finalidade da condição humana. Como a história que ouviremos do peixe que procurava o Oceano sem perceber que já lá estava porque só via “água”, Joe só precisava de uma mudança de perspectiva para entender que teve uma vida completa e realizada.

E é também dentro desta amizade que encontro essa capacidade notável da Pixar em abordar temas pesados pelo uso da metáfora. Já falei como, em Toy Story 4, a caixa de voz que Woody dava à boneca Gabby representava o transplante voluntário de órgãos. Em Soul, há 22 e o que a sua rejeição em viver acaba por representar: a depressão clínica. Pois quando esta se metamorfoseia numa “alma perdida” (vultos escuros cujas obsessões monomaníacas os consomem, tornando-os em monstros etéreos ambulantes), Joe descobre a quantidade abundante de pensamentos tóxicos que a atormentavam, provocados pela interacção com todos aqueles (entre os quais Joe) que lhe apontavam insistentemente os seus defeitos e demoliam a sua auto-estima. É aqui que vemos a personagem no seu estado mais vulnerável e compreendemos que a Pixar está a lidar alegoricamente com essa doença psíquica que, no seu ponto mais paroxístico, leva alguém a estar mergulhado num abismo negríssimo, como aquele em que 22 está envolta, num sentido literal e metafórico. Que haja um estúdio que não tenha receio em abordá-la num filme “para crianças” é totalmente merecedor de admiração.

Chegamos ao final, com o protagonista a sair de casa, depois de tanto tempo no limbo. É um momento, por si, auto-explicativo, onde tentar verbalizá-lo resultaria numa mera platitude, mas esta última cena é uma resposta perfeita à primeira, ao apresentar-nos um Joe renascido, de postura confiante, rosto sorridente e olhar sereno, uma imagem que em tudo contrasta a inicial pela sua tranquilidade, optimismo e esperança, e que pode, mais uma vez, ser sumarizado por um par de versos (neste caso, os derradeiros) da canção referida no começo: “It’s the dawn of a day of glory: millennium / I tell you things ain’t what they used to be”. E para Joe, não são mesmo.

Soul (Soul – Uma Aventura com Alma, 2020) está disponível na plataforma Disney+.

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Duarte Mata

Perguntaram-lhe: "Mr. Ford, you made a picture called 'Three Bad Men', which is a large scale western, and you had a quite elaborated land rush in it. How did you shoot that?" E ele respondeu: "With a camera."

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