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“Quai d’Orsay”: obrigado, Tavernier (a Stabilo Boss)

De Luís Mendonça · Em 13 de Abril, 2021

A última vez que estive com Bertrand Tavernier (1941-2021), um dos cinéfilos mais sábios do século XX, foi “à saída” de um grande filme de Allan Dwan, Silver Lode (Falsa Justiça, 1954). Digo que “estive” com ele, mas não foi coisa presencial. O “encontro” aconteceu, na realidade, num extra de DVD, presente na caixa da excelente editora francesa Sidonis Calysta, dedicada ao cinema de Dwan. São várias as apresentações que Tavernier gravou para esta editora e que nos permitem aceder a este saber efervescente e generoso. Para matarmos saudades e nos enriquecermos, valem ainda os textos, os livros e também os posts do seu magnífico blogue (actualizado quase até “à última hora”) simplesmente chamado DVDBlog.

Quai d’Orsay (Palácio das Necessidades, 2013) de Bertrand Tavernier

Como bom cinéfilo, Tavernier era um coleccionador, de filmes, de livros sobre cinema, de imagens e ideias, de imagens como ideias. Como outro cinéfilo obsessivo e apaixonante, que também muito escreveu sobre este seu amor (que também é nosso), François Truffaut, Tavernier fez cinema e tal facto nunca extinguiu a chama cinéfila, a paixão coleccionadora pelo home cinema e que se manifesta outrossim numa impressionante acumulação de informação. Muita, muita informação, canalizada com uma paixão rara, comovente. Não espanta que fosse amigo de Martin Scorsese, outro coleccionador e outro cicerone da melhor – e, por vezes, mais escondida – memória cinéfila.

Scorsese desempenha um pequeno – mas muito interessante – papel em Round Midnight (À Volta da Meia-Noite, 1986), dos poucos filmes realizados por Tavernier a inscrevê-lo num certo mainstream da chamada “história oficial do cinema” – o outro talvez seja o datado, grotesco, ou simplesmente desarticulado à nascença, Coup de torchon (Justiceiro por Conta Própria, 1981). Cito estes dois títulos pois me parecem ser os mais citados da filmografia de Tavernier, mas também os evoco ciente de que há muito por desbravar. Aliás, poucos dias depois de saber da morte de Tavernier, deparava-me com um elogio sincero vindo de um crítico particularmente exigente chamado Michel Mourlet (in Survivant de l’âge d’or: Textes et entretiens sur le cinéma 1970-2020). Amigo de Tavernier, é certo, mas Mourlet refere títulos que pouco vi referenciados nos obituários dedicados ao realizador e que me deixaram a salivar pelo modo como esse tão cauteloso crítico os adjectiva de “extraordinários”, caracterizando-os como estando em perfeita sintonia com as paixões cinéfilas de Tavernier pelos clássicos, sobretudo os de acção e aventura (Raoul Walsh é um desses amores).

Por exemplo, na sequência dessa minha leitura, La passion Béatrice (1987), filme realizado logo depois desse tão popular e justamente amado Round Midnight, foi directamente para a minha watchlist. Com efeito, se a morte de alguém que consideramos especial serve para alguma coisa, servirá também para isto: para relembrarmos o bom – o tanto, tanto que nos transmitiu -, mas também para descobrirmos algo, escavando mais fundo. E quem sabe servirá também para reavaliações. Faço este cauteloso intróito porque não me quero precipitar, ainda para mais dentro da minha relativa ignorância (face a uma filmografia, apesar de tudo, extensa), em “arrumar” a obra do Tavernier, realizador, salvando somente o seu trabalho como historiador, enciclopedista e cinéfilo.

A pouca atenção dada ao trabalho de Tavernier como realizador, pelo menos em Portugal, facilmente se faz prova na dificuldade que sinto em aceder aos seus filmes. Encontro dois títulos na plataforma Filmin e opto por aquele sobre o qual li menos críticas ou menos críticas positivas. Assim, excluo o filme “de enciclopedista”, muito aclamado, que acabou por se revelar a sua derradeira obra, uma carta de amor ao cinema clássico francês chamada Voyage à travers le cinéma français (Uma Viagem Pelo Cinema Francês com Bertrand Tavernier, 2016). E ponho a girar Quai d’Orsay (Palácio das Necessidades, 2013). Não estaria aqui a escrever sobre este filme, se não me tivesse surpreendido pelo seu dinamismo, leveza, energia…

Uma espécie de staccato com o seu quê de hawksiano embala uma história de bastidores da política que me fez pensar em All the King’s Men (A Corrupção do Poder, 1949), ainda que, claro, aqui sem o tom acerbo, isto é, sem a severidade crítica própria do filme de Robert Rossen. Aliás, este deve ser um dos pontos a salientar nesta comédia de Tavernier: versa sobre os corredores do poder, mas não o faz para diminuir ou manchar a classe política. Ao invés, parece que estamos num símile político da redacção de His Girl Friday (O Grande Escândalo, 1940), sendo o xadrez das relações internacionais jogado com um misto de loucura e brilhantismo pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Alexandre Taillard de Worms (um deliciosamente burlesco Thierry Lhermitte). Tavernier retrata esta grande personagem 100% ficcionada não directamente mas mediante o olhar timorato de um assessor, o “falso protagonista” encarnado por Raphaël Personnaz. Em certa medida, este jovem contratado para moldar “a linguagem” do Senhor Ministro está para o estadista como a personagem de François Cluzet, o fã de jazz, estava para “o Deus do saxofone”, baptizado com o nome Dale Turner, e interpretado por the one and only Dexter Gordon: inebriado, esmagado, desnorteado, escravizado. É aqui que penso no citado filme de Rossen, já que a grande persona do político corrupto (memorável máscara de Broderick Crawford) é-nos apresentada (e modelada) pelos olhos do repórter interpretado por John Ireland.

Talvez Tavernier acabe por se afeiçoar a esta personagem, impedindo que os excessos da caracterização o consumam, na sua própria credibilidade ou na sua elegância inglesa.

Este olhar a partir de fora, canalizado pela personagem do assessor, permite libertar (pôr à solta, enfim) o verdadeiro protagonista do filme, o sui generis Senhor Ministro, Alexandre Taillard de Worms, tornando-o uma figura cartoonesca que irrompe cenário adentro, deixando atrás de si um rasto de destruição (folhas a esvoaçar, portas em fanicos). O seu discurso é directo, martelado com o vigor e a virilidade de um General Patton – ou de um dono de jornal num filme de Samuel Fuller – e atravessado por uma ironia, finura ou wittiness tipicamente ingleses. De Worms é um ciclone com duas pernas e língua irrequieta. Quem é apanhado por ele, das duas uma: ou tem um ataque de nervos e implode ou, como estratégia de sobrevivência, mantém uma calma seráfica (o melhor elemento do elenco deste filme: o primoroso Niels Arestrup, chefe de gabinete que é uma espécie de “versão Prozac” do tonitruante Ministro).

A persistência do ofício mais ou menos inglório de “dar um sentido” a esse vendaval chamado De Worms é o tema escondido mais relevante, que, de novo, parece aproximar esta linguagem (não a do Senhor Ministro mas a da Senhora Comédia) do universo clássico de Howard Hawks. A personagem-testemunha de Personnaz vai ganhando a noção de que não se trabalha propriamente para De Worms, mas mais “a partir dele”; que os discursos a preparar são trabalhos sempre em aberto, isto é, hélas, sempre abertamente insuficientes para alguém que funciona seguindo grandes linhas de acção, não dispondo de tempo para o mundo das coisas corriqueiras (ler um texto – já agora, que não os fragmentos de Heráclito! – é uma dessas coisas). Na cena mais delirante, De Worms disserta sobre a importância de ter sempre à mão um belo conjunto de marcadores Stabilo Boss, sublinhando, sublinhando e sublinhando. Marcar a amarelo é assim como “disparar” sobre o texto a (pouca) atenção que o estadista dispensa à “sacrossanta” linguagem. As palavras importam, diria um Nanni Moretti, e, em política, com uma palavra a mais e outra a menos, com uma frase antes ou depois de outra, constroem-se narrativas que encrencam até as melhores relações internacionais.

Toda esta “alta rotação”, pelo que percebo da pesquisa também rápida que fiz, poderá advir do material de origem: a banda desenhada assinada por Antonin Baudry e Christophe Blain, Quai d’Orsay – Chroniques diplomatiques. Com efeito, a construção episódica, à guisa de uma colecção de gags, e a própria direcção de fotografia, assente numa escolha de cores assaz garridas, algo plásticas de mais, denunciam essa origem. Ao mesmo tempo, não se consegue levar estas personagens muito a sério, não saindo nunca o filme do registo da caricatura que reincide nos mesmos gestos ou tiques excessivos. Não obstante, este crescendo de “loucura controlada/mecanizada” nunca atinge os píncaros de uma linguagem (satírica) do excesso, que se anuncia sem se enunciar em toda a linha – a excepção delirante é mesmo essa perambulação sobre os marcadores Stabilo Boss.

Talvez Tavernier acabe por se afeiçoar a esta personagem, De Worms, impedindo que os excessos da caracterização o consumam, na sua própria credibilidade ou na sua elegância inglesa. Este respeito contido pelo doido Ministro é o que ressalta nos minutos finais, naquele discurso exemplar dito numa sala cheia da ONU. Depois de tanto drama, “sangue, suor e lágrimas”, o político acaba por fazer tudo acontecer e com honrosa souplesse. Pode parecer insuficiente para projectar mais alto a sátira política, mas acaba por redimir toda a macacada e oferecer-nos uma personagem, com alguma densidade, escondida na caricatura. Trata-se de uma conclusão que introduz alguma nuance dramática nesta comédia ligeira com boas doses de dinamismo e energia clássicas. Se podemos começar por aqui uma certa (re)descoberta do Tavernier, cineasta? E porque não?

Quai d’Orsay (Palácio das Necessidades, 2013) está disponível na plataforma Filmin.

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Luís Mendonça

"The great creators, the thinkers, the artists, the scientists, the inventors, stood alone against the men of their time. Every new thought was opposed. Every new invention was denounced. But the men of unborrowed vision went ahead. They fought, they suffered, and they paid - but they won." Howard Roark (Gary Cooper) in The Fountainhead (1949)

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