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Palatorium e comprimidos cinéfilos: Janeiro

26 de Janeiro de 2022

Consulte: Palatorium do dia 7 de Janeiro de 2022

Os últimos dias têm sido algo atribulados no que concerne a ida ao cinema, com a exigência de teste negativo a atrapalhar alguns planos, mas mesmo assim, não têm faltado algumas estreias notáveis. Se Gûzen to sôzô (Roda da Fortuna e da Fantasia, 2021) de Ryûsuke Hamaguchi parece reunir algum consenso, temos também espaço para a opinião dissidente de Ricardo Gross no comprimido seguinte; West Side Story (2021) de Steven Spielberg faz a sua estreia na tabela (e de que forma, não deixe de ler o texto de Ana Cabral Martins), tal como o novo filme de Aaron Sorkin, Being the Ricardos (2021), – não perca o texto de Duarte Mata, muito provavelmente melhor que o filme. Além do já referido comprimido, espaço ainda para um sobre Hytti nro 6 (Compartimento n.º 6, 2021) de Juho Kuosmanen (por Daniela Rôla), sobre Tout s’est bien passé (Correu Tudo Bem, 2021) de François Ozon (por Ricardo Gross) e sobre um dos filmes do momento, Don’t Look Up (Não Olhem para Cima, 2021) de Adam McKay (por João Araújo).

Acrescentaram-se, entretanto, comprimidos de Licorice Pizza (2021) de Paul Thomas Anderson, Serre moi fort (Abraça-me com Força, 2021) de Mathieu Amalric, por Daniela Rôla; The Matrix Resurrections (2021) de Lana Wachowski e Spider-Man: No Way Home (Homem-Aranha: Sem Volta a Casa, 2021) de
Jon Watts, por Ana Cabral Martins; e L’événement (O Acontecimento, 2021) de Audrey Diwan, por João Araújo.

Gûzen to sôzô (Roda da Fortuna e da Fantasia, 2021) de Ryûsuke Hamaguchi

Dois dos filmes mais aborrecidos que vi em 2021 foram, sem dúvida, Domangchin yeoja (A Mulher Que Fugiu, 2020) de Sang-soo Hong e Roda da Fortuna e da Fantasia de Ryûsuke Hamaguchi. Percebo a aproximação que estabeleceram entre ambos, com a diferença de que os diálogos no Hamaguchi são mais apimentados, e o filme é mais polido em termos visuais. Mas nos dois a mesma pobreza estética e uma ligeira sensação de enjoo provocado pelos tons pastel das cenas em interiores, que é onde estes filmes passam a maior parte do tempo.

São raros os exemplos da sétima arte onde não percepcionamos qualquer movimento (existem filmes com cor e texto, apenas, filmes ditos experimentais), e o que faz girar a roda deste Hamaguchi, tal como no filme de Sang-soo Hong, são os encontros que motivam conversas. A acção é minimal, pretexto para a deslocação que leva à troca de diálogos seguinte. Trata-se de um cinema eminentemente palavroso e cerebral, de conversas prosaicas sobre as vida, os amores e a infelicidade, e que, no caso do Hamaguchi, como num jogo de inversão de papéis, as personagens podem manter secreta a sua identidade num outro contexto, ou até fingirem ser uma pessoa que não são.

Sinceramente, achei bastante estéril o naturalismo deste Hamaguchi (o homem que diz não existir separação entre ficção e documentário), e em matéria de perversidade é comparável a uma bibliotecária que nos fizesse festinhas de luvas postas. E depois, Hamaguchi parece-me ser actualmente, de entre os cineastas mais celebrados, o exemplo mais evidente do “cinema do papá”. Rohmer será sempre o primeiro nome a saltar à ideia quando falamos deste tipo de filmes onde o acto da conversação assume maior protagonismo. Mas Hamaguchi também evoca o cinema de Ozu, em particular quando filma os actores a falarem directamente para a câmara, e na aparente simplicidade de processos cinematográficos. Gosta quem gosta, eu acho um tédio.      

Ricardo Gross, 7 de Janeiro de 2022

Hytti nro 6 (Compartimento n.º 6, 2021) de Juho Kuosmanen

O comboio é o cenário cinematográfico por excelência, palco de todos os géneros – romântico, drama, mistério, western, film noir… Enfim, quando entramos neste Hytti nro 6 (Compartimento n.º 6, 2021), não sabemos bem o que esperar, se aquilo que testemunhamos é o início de um thriller psicológico. Mas, afinal, damos por nós no domínio da peregrinação, com modernos peregrinos, em tudo semelhantes aos modernos peregrinos do filme de Michael Powell e Emeric Pressburger, A Canterbury Tale (Três Modernos Peregrinos, 1944), redescobrindo os caminhos de peregrinos do passado e reequacionando a sua busca. Durante vários dias percorremos os estreitos corredores do comboio, entre a segunda classe e a carruagem-restaurante, numa vívida encenação de cheiros – as tangerinas descascadas no compartimento n.º 6, o ar fétido exalado pelos beliches que se amontoam na terceira classe, as fugidas ao exterior em cada paragem em busca de ar fresco, até mesmo o chá que adivinhamos de fraco aroma. Um périplo que desagua na cidade portuária de Murmansk, numa presença constante da água, da neve que tudo cobre, do ar gélido e puro que se respira. A busca pelos petróglifos, um nome enigmático por diversas vezes citado ao longo da viagem, suscitando sempre um olhar descrente a quem o ouve, e que acreditávamos não passar de um MacGuffin, nome sem tradução real, acaba por ter concretização, como o conceder de uma graça no final da peregrinação. A persistência de Laura (Seidi Haarla) parecia incompreensível, mas o seu acto de fé é recompensado. Os petróglifos existiam de facto, revelando-se mais reais do que a relação amorosa que ela deixou para trás e que a tinha colocado no caminho que a levou até Murmansk.

Daniela Rôla, 7 Janeiro de 2022

Tout s’est bien passé (Correu Tudo Bem, 2021) de François Ozon

Estamos já perto do final deste Ozon, quando o filme nos sujeita a um conjunto de peripécias que dir-se-ia resultarem de um inesperado encosto tipo “gaiola das malucas” a uma narrativa até aí de fundo dramático. Mas tudo se resolve e o ancião André Bernheim (André Dussollier), acometido de um AVC no começo do filme, vai ser finalmente enviado de ambulância para uma clínica de Berna onde praticam a morte assistida. Ao despedir-se da filha mais nova, André diz-lhe que a história daqueles últimos tempos daria um bom romance como os que escreve a sua outra filha, Emmanuèle (Sophie Marceau). A graçola meta-ficcional tem efeito retroactivo, quando o genérico final informa que o filme adapta o livro com o mesmo nome escrito por Emmanuèle Bernheim.

François Ozon é um tudólogo em matéria de projectos cinematográficos em que pega. O que passou a manter-se de filme para filme é o sentimento de um cinema que é feito para o grande público, de arestas limadas, que ilustra os assuntos difíceis e que pratica uma agilidade narrativa que é também a marca de um audiovisual despersonalizado. A competência superficial dos objectos é inquestionável, mas não podemos deixar de lamentar que um realizador em tempos tão interessante, se tenha deixado encaminhar para o tratamento familiar e inócuo de temas ditos fracturantes. Este domingo à tarde serve-se a eutanásia.    

Ricardo Gross, 7 de Janeiro de 2022

Don’t Look Up (Não Olhem para Cima, 2021) de Adam McKay

O novo filme de Adam McKay tem dividido opiniões em parte pelo seu retrato de uma realidade muito próxima da actual, pelos paralelos traçados entre os acontecimentos do filme e do que temos vivido nos últimos tempos, que carrega num tom exagerado, mas que corresponde a tempos exagerados. É assumidamente um comentário político sobre a sociedade contemporânea, como aliás têm sido os últimos filmes de Adam McKay [depois de uma fase mais burlesca, com títulos como Talladega Nights: The Ballad of Ricky Bobby (As Corridas Loucas de Ricky Bobby, 2006) ou Step Brothers (Filhos e Enteados, 2008)], que evoca o espírito politicamente activo de alguns filmes americanos dos anos 70 (entre ficções a partir de eventos reais e distopias-alegorias), e algo que é bem-vindo, pois é um tipo de filme que tem vindo a desaparecer, como se o comentário político não tivesse lugar no cinema, rejeitado pelas audiências e por alguma crítica – afinal, ninguém quer ser repreendido ou levar com um sermão. O facto do filme ter uma mensagem e agenda ser visto como algo negativo tem alguma piada, já que o próprio filme demonstra precisamente os efeitos de não querer ouvir verdades inconvenientes ou de não prestar atenção a notícias deprimentes apresentadas por peritos qualificados – basta ver a forma o acontecimento do filme é revelado num talk-show, em nada distinto da nossa sociedade de espectáculo. 

Através da imagem de um cometa que está em rota de colisão com a Terra e que ameaça a sobrevivência humana, Don’t Look Up (Não Olhem para Cima, 2021) constrói de forma inteligente e corrosiva um paralelo com outras ameaças menos visíveis: se a existência de negacionistas e a falta de preparação dos governos pode ser um comentário sobre a actual pandemia, o verdadeiro alvo de McKay é a inacção perante os perigos das alterações climáticas. Se o filme recorre por vezes a uma caricatura ou simplificação que serve as suas intenções criativas, a verdade é que ao materializar essa ameaça em algo mais tangível (e acelerado), torna esse perigo em algo mais imediato e acessível, como já tinha feito com The Big Short (A Queda de Wall Street, 2015) de forma pedagógica – e ao mesmo tempo expõe o ridículo da nossa falha colectiva: desde a politização de factos científicos, da informação como entretenimento, da transformação do ecologismo em algo corporativista e a fé nas grandes empresas como salvadoras humanas: os melhores momentos são mesmo os mais ridículos, como a rábula “don’t look up” / “look up” (algo demasiado improvável de acontecer na realidade, certo?), ou o gag do general de 5 estrelas que mete uns dólares ao bolso. O ritmo acelerado do filme acompanha uma realidade onde as redes sociais ditam a atenção mediática, pontuado por algumas pausas de reflexão interior das suas personagens, e é nas duas personagens centrais (interpretadas por Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence), e na sua redenção pessoal na parte final do filme, que o olhar de McKay se transforma de simples escárnio para algo mais complexo. Duas notas finais: será esta a sequela de Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb (Dr. Estranhoamor, 1964) [ou de Idiocracy (2006)?] que merecemos? E, obviamente, Bronterocs.

João Araújo, 7 de Janeiro de 2022

Licorice Pizza (2021) de Paul Thomas Anderson

Lembram-se da personagem de Michael Douglas em Wonder Boys (Wonder Boys – Prodígios, 2000), de Curtis Hanson? O professor Grady Tripp que, entre outras actividades, estava a escrever um livro que já ia em centenas de páginas, suficientes para encherem uma caixa de cartão, tudo dactilografado a espaçamento simples? A dada altura, a discípula Hannah Green diz-lhe isto: “I could be wrong, but it sort of reads in places like you didn’t make any choices. At all. And I was just wondering if it might not be different if… if when you wrote you weren’t always… under the influence.” Em suma, é esta a sensação com que saímos do cinema depois de ver Licorice Pizza (2021). Paul Thomas Anderson pegou no videoclip de Summer Girl, que ele tinha realizado para as Haim em 2019, e deu-lhe continuidade. Se aí Alana Haim andava, agora corre, intercalando os diversos segmentos da narrativa, como também Cooper Hoffman corre. Embora estes sprints sejam uma constante em Licorice Pizza, o filme não corresponde a esse ritmo, parecendo arrastar-se longamente e sem rumo. O ambiente é feito de uma nostalgia bonita, de roupas muito cool, é certo. “I’m cooler than you”, diz Alana. Tudo bem, mas não basta ser cool.

O trailer deixava adivinhar um Paul Thomas Anderson “tarantinado” e, infelizmente, o filme acaba por confirmar essa impressão. Ficámos com vontade de regressar ao sublime Phantom Thread (Linha Fantasma, 2017) e a um outro Paul Thomas Anderson.

Daniela Rôla, 25 Janeiro de 2021

L’événement (O Acontecimento, 2021) de Audrey Diwan

Raras são as vezes em que a atenção dada a uma solitária personagem, e a forma apegada, persistente e próxima como a câmara – como se dissesse de forma apaixonada, eu estou a teu lado, sem reservas – acompanha a sua história sem a perder de vista, encontram uma figura de tal forma complexa, completa e a lutar pela sua sobrevivência, pelo seu futuro, que justifiquem esse tratamento obcecado. Mas nesses raros casos de personagens-ciclones, como por exemplo em Rosetta (1999) dos irmãos Dardenne ou Wendy and Lucy (2008) de Kelly Reichardt, o resultado é assombroso, com essa dança entre personagem e câmara capaz de mesmerizar – com as devidas distâncias, já que ao filme de Audrey Diwan falta a perfeição de enquadramentos e a urgência existencial do filme dos Dardenne, e a beleza do minimalismo e ritmo sereno do filme de Reichardt. O filme decorre em 1963, em França, e acompanha a história de Anne, estudante universitária com um brilhante futuro pela frente, pelo menos até ao ponto em que descobre estar grávida, numa sociedade conservadora onde o sexo fora do casamento – para as mulheres – ainda é tabu, pecado grave que nega qualquer pretensão de Anne a um futuro como mãe solteira ou estudante, e sociedade que ao mesmo tempo criminaliza quem procurar ou estiver envolvido na prática de um aborto, e que no caso de clandestino, acarreta possíveis problemas de saúde graves e até mortais.

Enquanto tenta resolver o seu futuro e encontrar um aliado, Anne está profundamente assustada, mas não pode deixar que ninguém perceba isso, já que todos à sua volta estão mais assustados ainda com a possibilidade de algo que fuja às normas ou algo ilícito, como o sexo, uma gravidez, ou um aborto. O que sobressai mesmo é uma actriz em estado de graça (a extraordinária Anamaria Vartolomei), e a construção de uma personagem com uma fúria interior de seguir o seu caminho perante o ofuscamento das personagens à sua volta: Diwan reforça por várias vezes o contraste entre a solidão e perseverança da personagem principal perante o recolher dos que estão à sua volta, como as amigas que lhe dão conselhos sobre sexo mas são virgens, ou o amigo que se dispõe relutantemente a ajudá-la mas ao descobrir que ela está grávida tenta ter sexo com ela; do pai da criança, incapaz de uma qualquer reacção que não apenas egoísta; ou dos pais de Anne, inconscientes do drama da filha, que numa cena se riem como crianças. Diwan, que vai construindo ao longo deste caminho um retrato incriminador da sociedade francesa no início da década de 60, alterna entre a tal câmara à mão que não deixa Anne fugir, e planos aproximados do seu rosto onde procura refúgio, uma proximidade que pode representar o sentimento claustrofóbico que parece cercar Anne à medida que o mundo se fecha à sua volta, mas que neste caso é também sinal de afeição.

João Araújo, 25 de Janeiro

Spider-Man: No Way Home (Homem-Aranha: Sem Volta a Casa, 2021) de
Jon Watts

É difícil falar de Spider-Man: No Way Home (Homem-Aranha: Sem Volta a Casa, 2021) sem falar de tudo o que o envolve. Este não é um filme que consiga existir num vácuo ou tratado enquanto objecto sem ser pensado no seu contexto. Ou seja, enquanto filme, funciona no sentido em que lida, brinca e está em conversa com todos os filmes já feitos sobre esta personagem de banda-desenhada. Ao ver o filme em sala, tendo acompanhado o historial cinematográfico de Peter Parker, é fácil sentir um tremor de emoção quando [spoilers?] os três actores que o protagonizaram no grande ecrã aparecem juntos. Especialmente ao ouvir a surpresa de quem, na audiência, está completamente surpreso com esta aparição. É também fácil pensar que, dados todos os pratos no ar — a cooperação Sony e Marvel, a integração de três Homens-Aranha, a continuação da história do Peter Parker de Tom Holland, o uso da personagem de Doctor Strange (com a sua própria sequela a sair este ano), ou a quantidade estonteante de vilões apresentados —, o filme acaba por conseguir fazer um truque de magia interessante e quase parece que tudo funciona bem ou faz sentido. Mas chegamos ao final, e fora as interações de Tom Holland com Zendaya e Jacob Batalon, que acabam por ser os momentos de graça deste filme, saí sem saber o que fazer com tantas reinvenções. As personagens de banda-desenhada, como Stan Lee as via, eram feitas para existir em suspensão, sem grande evolução, para a serialidade ser eterna. Esta faca de dois gumes funciona quando chegamos a pay-offs para momentos da história dos vários Peter Parkers que nunca esperámos ver, e sofre quando o despem de tudo o que aprendemos a gostar no Peter mais contemporâneo. Não há forma de voltar a casa e, neste caso, a despedida é sentida mais como um balão que se esvazia do que com uma partida em êxtase. E, claro, este não será o fim. Haverá sempre outro Homem-Aranha.

Ana Cabral Martins, 25 de Janeiro

Serre moi fort (Abraça-me com Força, 2021) de Mathieu Amalric

Desde há muito que o cinema vem tratando como pecado imperdoável o acto da mãe que abandona os seus filhos [ainda estamos a tentar perdoar Meryl Streep em Kramer vs. Kramer (Kramer contra Kramer, 1979)]. E é justamente esse pecado imperdoável que (aparentemente) nos é dado a ver no início de Serre moi fort (Abraça-me com Força, 2021). O dia começa a nascer, percebemos que é o fim de uma noite de tormento para Clarisse (Vicky Krieps), ela abandona a sua casa e a sua família e parte, tentando libertar-se de algo que a persegue, lançando-se à estrada, mas sempre recorrendo a memórias da vida familiar que ficou para trás. Mas será que estamos bem cientes daquilo que estamos a ver? Não é que se trate propriamente de um filme com plot twist – as pistas estão lá todas desde cedo, basta querer e saber escutá-las, estar atento. O que o filme nos pede é para irmos avaliando ponderadamente a história que está à nossa frente. No fundo, ver o filme conforme vai seguindo o seu curso, mas também ir revendo aquilo que do filme ficou para trás. E assim vamos descobrindo toda uma galeria de fantasmas e de duplos – não apenas personagens, mas sons que se sobrepõem e complexificam de forma prodigiosa. O resultado será, em certos momentos, sentirmo-nos perdidos, tão perdidos e tão confusos quanto Clarisse.

Daniela Rôla, 25 de Janeiro

The Matrix Resurrections (2021) de Lana Wachowski

Eu gostava de ter gostado deste quarto filme sobre Neo, Trinity e a sua luta contra a Matrix. As Wachowski (mesmo que aqui seja apenas Lana ao volante) são realizadoras originais, com ideias ambiciosas, um pendor romântico e um olho especial para o sumptuoso no ecrã, mas também para o estranho, o desconcertante. Além do mais, aprecio a qualidade meta-textual da realizadora que é convencida a voltar a uma história que tinha deixado para trás e a forma como isso é parte dos alicerces do filme. Mas essa qualidade é levada longe demais ou talvez sejam ideias a mais que não confluem em algo que seja genuinamente excitante. Mas, em última análise, o filme peca pelo seu aspecto e, sobretudo, por citar directamente imagens do filme original, criando um ponto de comparação em que o que estamos a ver é francamente menos interessante do que o filme de 1999. Pensar em The Matrix é pensar num filme que redefiniu a forma como se filmava acção e este filme é simplesmente desinspirado e frequentemente tosco nessa importante faceta. E essa é a maior desilusão.  

Ana Cabral Martins, 25 de Janeiro

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