As imagens surgem como um sopro de vida: poesia de ternura por uma colecção de paisagens que compõem um cenário que se habita ao longo de uma viagem que parte do fim. Do imaginário – esse extravasar da memória do real – nasce um caminho de amor, de dor e de esperança
As imagens surgem como um grito inaudível: um retrato da(s) história(s) de futuro negado. Da tragédia do assassinato de Terra Alexis Wallace a 17 de Janeiro de 2008, em Bridgerton, Connecticut, floresce um filme de homenagem.
As imagens surgem como uma carícia: um gesto delicado para com o processo de luto de uma mãe, de uma família. Da incomensurável dor navega-se pelas águas que tocam nas fronteiras da aproximação – esse mar de conexão.
Fórmulas repetem-se no tríptico: dos tempos, dos espaços, das gerações. A casa é um ponto que (nos) une, como uma base que (des)conhecemos. Um centro para este lugar fílmico de porcelana, que se transforma num espaço de procura sem fim. Indefinidas fronteiras, enaltecidas pelo rústico analógico, são colocadas em grande plano na concepção ceramista de uma fábula que parte das (incalculáveis) perdas e que se move pelo terreno sobrenatural.
Não há limites: aqui tudo é possível.
Fórmulas rompem-se: o híbrido desfaz as membranas que separam a realidade da ficção da vida.
Elementos combinam temporalidades, geografias. O centro é a relação aqui nunca esquecida – e para sempre mantida: de mãe e de filha. Flores que crescem no espaço da partilha.
Reitera-se o não-dito: tentativa de compreensão, compreensão; elo de dissociação, dissociação. As sonoridades encapsulam essências fulcrais num jeito de envolvimento que estremece as harmonias inalcançáveis. Uma linearidade sinfónica das emoções intocáveis. Os quadros planeados – e regidos pelos traços das calculadas geometrias compostas pelas individualidades que deambulam pelos caminhos da possibilidade dos (mais diversos) cenários cinematográficos – enriquecem a (desejada) estabilidade disruptiva.
Não há conforto: aqui nada é impossível.
Mas o filme é – ou pode ser –, em si, a casa. E Cette maison (2022), de Miryam Charles, mostra-nos realidades de terror: o assassinato de Terra Alexis Wallace, o sentimento de deslocamento constante de comunidades imigrantes. Um pesadelo ou a inimaginável violência do real. Cria (ou abre o caminho), ainda assim, (para) um registo de esperança. Nesse fogo que surge e não se apaga, o filme ecoa. Aqui há e haverá sempre amor: o lugar para (e de) Terra Alexis Wallace.