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Uptight, parte I: O Denunciante

De Vítor Ribeiro · Em 28 de Novembro, 2022

Em ruas tomadas por sombras e nevoeiro e pelo lixo, um cartaz de uma recompensa pela captura de um foragido solta-se da parede e pela acção do vento vai colar-se às pernas de um homem. Mais tarde entenderemos esta sequência como uma insinuação de uma traição motivada pelas forças da natureza, uma mácula que contagiará aquele personagem. Esse homem, o protagonista de The Informer (O Denunciante, 1935), é interpretado por Victor McLaglen, um dos actores de eleição de John Ford, quase sempre na correspondência do arquétipo do bom homem: amigo do seu amigo, muitas vezes bobo da corte, de forte complexão física e de grande coração, mestre no exercício da empatia e da compaixão, com queda para o álcool, que serve para promover a socialização, o ajuntamento e a cumplicidade entre homens, que invariavelmente se resolve à pancada.

Ford instalou a trama nos anos 20 em Dublin, durante a guerra da independência da Irlanda, nas movimentações fora da lei do IRA (Exército Republicano Irlandês), que acabara de expulsar Gypo Nolan (McLaglen), por ele se ter recusado a executar um soldado britânico a sangue frio. Desde cedo o filme instala-nos numa nomenclatura e moral católicas, que decretam o destino do protagonista, como um Judas, um delator que se arrependeu tarde da traição a troco de um punhado de moedas de prata, condenado, assim, ao isolamento e à morte. Filme nocturno, de ruas imersas no vício: a prostituição, o jogo e o álcool moldados por dinheiro sujo.

A neblina a pairar nas ruas, que serve de escapatória dos comportamentos mais ou menos corruptos, é também uma metáfora para o desenho dos labirintos da natureza humana, que conhecerá no primeiro capítulo a traição. A primeira imagem de Gypo, após a denúncia do camarada do IRA, é a de um homem sentado, curvado sobre si mesmo, vergado pela culpa. Pouco depois, consumada a morte do amigo resultante da sua delação, Gypo encaminhar-se-á para o velório, resultado de um efémero alheamento das suas acções. O protagonista sentar-se-á junto da mãe do morto e a câmara de Ford colocá-lo-á do lado da sombra, recortado pela culpa. Prossegue, então, o mergulho no vício. O dinheiro sujo providencia o álcool para Gypo e para os demais, um vício que produz outros vícios e pecados e que o expõe, a ele que é forte como um touro, nas fraquezas do humano e na fuga à responsabilidade, através da companhia de outros homens, como quem se abriga na ancestralidade da tribo. Se conseguir embriagar o mundo todo, será coroado rei.

Gypo será depois julgado pela cúpula do IRA, sendo que ninguém parece questionar a legitimidade daquele tribunal improvisado. O dinheiro, elemento associado à sujidade do comportamento, servirá de prova para a condenação à liquidação do homem, que se revelará um covarde, um indivíduo frágil e incapacitado de fazer uso do livre arbítrio, uma criatura que é fechada numa caverna escura como um animal à espera de ser abatido. Perante a ausência das instituições e da lei, o contraditório na narrativa e no destino do indivíduo dependerá apenas da compaixão das mulheres. Essa caridade cristã teve como primeira intérprete a sua companheira, uma prostituta que teima em esperar por ele, mesmo depois de conhecer o seu destino. Também no julgamento, será a irmã do morto que pedirá clemencia para o denunciante. A culpa atribuída pelo tribunal não se aproxima da dimensão de outra culpa: Gypo colapsará aos pés e sob o olhar misericordioso da mãe do denunciado, a tempo de proferir a confissão que produzirá o alivio da culpa.

O valor da recompensa recebida por Gypo corresponde ao preço de dois bilhetes para os EUA. Essa montra com a viagem para a América voltará com insistência ao filme, como a possibilidade de aceder a um território de sonho, ao admirável mundo novo do século XX. The Informer surge a propósito de Uptight (1968), filme em que Jules Dassin transferiu a trama de Dublin para um gueto de Cleveland, nos dias que se seguiram ao assassinato de Martin Luther King. Curioso paralelo, que ficará para a próxima crónica, da resistência contra o status quo promovido pela monarquia britânica e a revolta dos afroamericanos contra o poder opressor e racista da América, a terra prometida.

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1930'sJohn FordJules DassinVictor McLaglen

Vítor Ribeiro

"Não gosto da vida verdadeira e por isso me dedico à ficção. Se a literatura não existisse, eu mesmo a inventaria." Enrique Vila-Matas

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