A 15 de Julho de 2012, o À pala de Walsh iniciava a actividade com um primeiro texto, escrito a oito mãos, pelos quatro fundadores do site. Entretanto passou uma década. Ao longo desses anos muitos foram os que escreveram connosco e publicámos mais de 2700 artigos, críticas, ensaios, textos coletivos, entrevistas, vídeos, conversas, ensaios visuais, crónicas e outras brincadeiras cinéfilas.
Depois de em Julho de 2022 termos apresentado o ciclo “10 anos à Pala” na Cinemateca Portuguesa, com 5 sessões seguidas de uma conversa sobre os filmes, apresentamos agora perto do final do ano uma outra iniciativa: o dossier “10 anos, 10 filmes”. Este dossier parte de um convite a um conjunto de realizadores portugueses cuja obra prezamos para nos ajudar a reflectir sobre o que foi esse cinema que por nós passou nos últimos 10 anos, através da escolha de um filme – que os tivesse surpreendido de alguma forma – e estreado durante esse período, acompanhado de uma pequena reflexão sobre essa escolha.
Hoje apresentamos a escolha de Sandro Aguilar, produtor, montador e realizador, entre outros, de Corpo e Meio (2001), A Serpente (2005), A Zona (2008), Mariphasa (2017) e Armour (2020).
Nova Iorque, Segunda-feira, 7 de Outubro de 2013.
Foi nesta última década, mas não foi bem um filme.
Estava na cidade por ocasião de uma retrospectiva do meu trabalho, organizada no contexto do NYFF – Views of the Avant Garde. O momento é frequentemente embaraçoso. Espreitar da cabine e reparar nos laços subterrâneos que levam cada pequeno filme ao seguinte. Nathaniel Dorsky apresentava, na mesma sala, na sessão seguinte, aquilo a que decidiu chamar Kodachrome Dailies from the Time of Song and Solitude (Reel 2).
Fez uma breve introdução na qual descreveu o contexto daquele objecto. Fora-lhe devolvido pelo laboratório – que estava (como quase todos à época) a ser desmantelado – material bruto que serviu para a montagem do seu filme de 2006, Song and Solitude: 18 fps, mudo, em película reversível, fragmentos do seu quotidiano miraculosamente atento ao movimento e à luz natural. Guardou a lata na cave e um dia, ao tentar resolver um problema mecânico no seu projector de 16mm, decidiu arriscar aquela bobina, à qual, confessa, não atribuíra particular valor (porque o verdadeiro filme fora já meticulosamente lapidado até atingir a sua forma definitiva).
Sem querer, deixou-se enfeitiçar.
Talvez seja vício de montador, nunca o material volta a ter a energia, a qualidade primitiva, desse primeiro visionamento, quando tudo são acidentes de percurso, os tempos mal medidos, a sequência fortuita. Nessa altura, ainda às escuras, podemos sonhar aquele objecto na sua melhor versão, com espaço para cumprir todas as suas possibilidades – apenas os filmes mais livres, aqueles que cada vez mais procuro, encerram em si um pouco desta ambiguidade operativa. Entretanto, parabéns.
Sandro Aguilar