Reencontramo-nos neste espaço de onde nunca saímos, de procura do movimento das – e nas – imagens. Essa compreensão que respiramos no sobressalto de descontrolo de uma rede incessante – omnipresente – que nos guia. Aí encontramos o consolo da era [(pós-)moderna]. Assumimos essa sede, bebendo dessa fonte enquanto (o) princípio, (do) meio e (no) fim. É o ritmo dos nossos passos: o inevitável do sentir, o indissociável do ser.
Very Nice, Very Nice (1961) de Arthur Lipsett
Já lá vamos.
Hoje ouvimos primeiro.
Não é curioso? Na verdade tudo começou aqui, desde logo, com a observação –, essa nossa leitura – de caracteres, de palavras, de frases – quase – feitas, de fugazes pensamentos. Mas tentemos escutar o som ecoado pela voz que ressalta. Fechando, por breves momentos, os olhos. Reiniciemos o encontro a partir daí – ou daqui, na verdade –, movendo-nos pelo movimento impulsionado por quem vos escreve. Nada de “meta”: tudo do momento.
Em escuta: o som em movimento.
Já cá estamos.
O aparato e a turbulência sonora marcam muito do estado de um tempo. A ideia de corte, de interrupção, de captação – ou enaltecimento – de um excerto de algo, que fica como um todo, sente-se sintomático. Num sistema que se move pela necessidade de atenção e produção constante, restam pequenos pedaços que nos tocam, que guardamos na sua efémera esfera de possibilidades. Estamos confusos, estamos cansados e (co-)dependentes. Nada de novo.
Vamos ao que interessa.
Hoje pensamos em Very Nice, Very Nice.
Um filme que principia – e medeia e finaliza – através do mecanismo de montagem do ramo auditivo. Sente-se, aliás, um tom de agradável dissociação entre o plano da escuta e da visão. A imagem apresenta-se como um complemento (bem lógico) de algo que, na sua loucura de (ir)racionalidade editada, nos transporta para um ramo de transposição das sensações da existência em plano (diário, semanal, mensal, anual) temporal, social e cultural para o plano fílmico. Não conseguimos respirar, não conseguimos parar: tudo se move freneticamente à nossa volta. E caindo já no caminho do olhar, não conseguimos ignorar a ironia do movimento estagnado, da paralisia do congelamento do movimento captado – o objecto da fotografia –, que circula por diferentes velocidades para se referir a algo mais do que a si próprio. Para servir de mote para o realce de uma aceleração desmedida. Do banal desconhecido, dos rostos esquecidos (mas destacados) na multidão, aos ícones (ir)reconhecíveis de impulso ao consumo.
Queremos parar, queremos respirar. E quem monta também sente: temos até espaço para uma leve meditação (bem bom!). Mas tudo faz parte das – e é previsto pelas – linhas já há muito traçadas e emaranhadas do sistema, em que até uma pausa serve a sua causa. Parar (ainda) serve o seu propósito.
Regressamos, assim, então, naturalmente ao desenfrear do consumo de ideias, de objectos, de vidas. Mas no final tentamos agarrar-nos a alguma esperança, que é deixada pendente num ponto final com sabor a vírgula que flui pelo espaço melódico desde esse lugar de reflexão dos anos 60 até ao dia – ou talvez mais ao momento – de hoje. Até aqui.
Estamos a ouvir (demais e a menos).
Queremos algo novo, queremos o/um futuro.
Chegaremos lá?