Notas sobre Queen of Diamonds (1991), de Nina Menkes
O tempo passa por um corpo adormecido. Um ser estendido sobre a (falsa) amenidade da ambiência, do (falso) conforto da cobertura. Uma presença impõe-se, desde logo, no rasgo, na ruptura (essa forma que se tornará referência): o destaque escarlate.
O tempo segue o seu caminho. A figura, essa, mantém-se no trespasse, atravessando as paisagens de um (falso) paraíso. Sem rumo, com destino único de encontros com a falência.
O tempo é o mestre da cerimónia deste espectáculo despido. A ordem de base para uma escuta – esse olhar – atenta sobre trivialidades do surrealismo (não-)performativo.
O tempo segura o plano. A vida decorre no fundo, ao centro. Um princípio de protagonismo que se reparte, assim, sobre aquela que nos guia – aquela que nos agarra – e aqueles (ou aquilo) que, estando à volta, ficam sempre em – ou à – frente.
O tempo conta (um)a história, o tempo mostra o tempo, o tempo é tudo no deserto. Diamante em bruto de navegação estagnada – esse olhar – pelos (não-)eventos que tudo dizem – ou mostram – sobre nós.
A rainha de copas passa por uma aparição adormecida. Um ser que toca no (falso) desligamento do mundo. Um notável desprazer para com um (sur)real que de tudo nada parece ter para dar. Mas no cuidado – esse mostrar -, no estar – esse vaguear -, no (pouco) dizer está a interrupção do son(h)o.
O talco – esse rei – esvoaça. Num passeio sobre as ondas, pelo espaço do som (não-)presente, (re)lança-se o foco sobre o meio, espalha-se a atenção para com o incorpóreo. A dispersão de um discurso que domina na sua indeterminação. São os outros – esses intangíveis – que permeiam o ar que se respira.
Mas o centro é feminino. Um corpo que encontra em si a sua própria lei. Um rosto que sobrevive na imposição descorada, passiva; um ser transeunte pelo concreto. O holofote – esse objecto para o objecto – desvanece. Assim denuncia-se, evidencia-se, trabalha-se sobre o abuso, a violência (no literal, no abstracto criativo). Um novo percurso está em frente. Seguimos.
O escarlate vibra sobre as cartas dadas. Uma por uma.
O fogo emana de uma árvore fundida. Folha a folha.
O ser, esse, resplandece. Passo a passo.
No final, ficam notas de luz sobre as escuridão.
O tempo passa. Abre-se a mão. O jogo, esse, continua: a luz segue, a vitória está por vir.