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“Women Talking”: contra o vazio do silêncio

De João Araújo · Em 30 de Março, 2023

Sarah Polley é uma das realizadoras mais interessantes no panorama do cinema norte-americano actual, na medida em que cada um dos seus filmes parece seguir uma direcção diferente dos anteriores, mostrando uma realizadora que mais do que repetir-se ou procurar uma linguagem própria, explora novos caminhos e possibilidades para o cinema narrativo clássico (reflexo também de um caminho como actriz cuidadosamente selecionado, trabalhando com autores como Atom Egoyan, David Cronenberg e Isabel Coixet). O seu anterior filme, Stories We Tell (Histórias que Contamos, 2012), um documentário biográfico e muito pessoal, era de uma inteligência rara na forma como olhava para o confronto entre imagens e palavras e colocava em causa o modo como para uma história ser credível basta parecê-lo; o seu primeiro filme, Away from Her (Longe Dela, 2006) era um comovente retrato do amor perante a decadência do corpo e da mente, sob a forma de um filme sóbrio e contido visualmente, rendido às palavras; Take This Waltz (Notas de Amor, 2011), uma comédia dramática desequilibrada é talvez o seu maior passo em falso, mas mostrava já uma vontade em aventurar-se por caminhos ainda não percorridos. Women Talking (A Voz das Mulheres, 2022), o seu primeiro filme depois de um interregno de dez anos, apesar de não ser o seu melhor trabalho, é uma forte adição à sua filmografia, examinando a narrativa como uma forma de confronto de diferentes pontos de vista, e de imaginar um mundo completamente separado da nossa realidade, pelo menos à primeira vista.

Women Talking (A Voz das Mulheres, 2022) de Sarah Polley

O filme é baseado numa história verídica de uma comunidade religiosa [do culto dos menonitas, que Carlos Reygadas já tinha filmado em Stellet Licht (Luz Silenciosa, 2007)], na qual durante anos as mulheres acordavam com as consequências de uma violação sexual sem se lembrarem de isso ter acontecido, que como explica uma voz feminina em off, mesmo perante as mazelas físicas, eram atribuídas a espíritos maléficos ou vistas como “um acto de imaginação feminina”. A questão que está no centro da conversa é revelada logo no início através dessa voz, que explica que uma vez que um dos homens dessa comunidade foi apanhado em flagrante, tudo o que já suspeitavam ficou claro para as mulheres. Os agressores são levados para a polícia da cidade mais próxima, e os outros homens juntam-se aos acusados, para tentar reunir a fiança para os libertarem. Durante vinte e quatro horas as mulheres da comunidade ficam sozinhas para decidirem o que fazer: não fazer nada e perdoar os agressores, ficar e enfrentar os homens ou abandonarem em grupo a comunidade, deixando os homens para trás. Segue-se um exercício democrático, que acaba num empate entre a segunda e terceira opção, que leva as mulheres a escolherem um grupo de representantes das diferentes famílias para chegarem a um consenso através de uma conversa. 

É um exercício de controlo da informação que o filme impõe perante o espectador, que dessa forma coloca o espectador ao lado destas mulheres na sua tentativa de compreender o que aconteceu (…)

Se a descrição dos eventos parece longa, tudo isto é revelado nos primeiros minutos do filme. A maior parte de Women Talking decorre durante essa reunião num celeiro onde as mulheres tentam definir o seu próximo passo, e onde se dá lugar ao que o próprio filme intitula de um “acto de imaginação feminina”, uma resposta irónica à acusação de que as agressões eram imaginadas. Essa sequência pode não ser a mais estimulante do ponto de vista visual, um pouco repetitiva por vezes e relativamente trivial em termos de encenação, mas isso é compensado inteiramente pelo lado intelectualmente estimulante da forma como o filme retrata as diferentes facetas das mulheres ali reunidas, as suas justificações e acima de tudo a forma como o filme revela a informação sobre esta história. É um dos trunfos da realização (a partir de um argumento sólido) a forma como consegue momentaneamente adoptar o ponto de vista de cada uma das vozes das diferentes mulheres, distintas nas suas motivações e que com o foco sobre si parecem tomar o lugar de personagem principal, nem que seja por alguns minutos, num desígnio suportado por um elenco irrepreensível: Rooney Mara, Claire Foy, Jessie Buckley (que destaca-se pela forma como usa a fisicalidade da sua personagem, ora distante, ora de costas voltadas para as outras), e Frances McDormand, entre outros nomes menos conhecidos. 

A personagem interpretada por Frances McDormand representa a facção derrotada na votação, e a primeira questão levantada não é pouco importante, dados os alicerces religiosos que comandam a existência desta comunidade, e que requere um papel de submissão total das mulheres perante os homens, que não pensassem por si, uma iliteracia forçada, e um desligamento em relação ao mundo exterior. A personagem de McDormand é a mais conservadora, que mesmo perante os factos defende a escolha do perdão como única via, porque é a base da sua religião, e a porta de acesso ao céu, e não consegue conceber outra forma de existência. 

Essa incapacidade é um aspecto fulcral do filme, que chega a esta história exatamente no momento do ruir da condição de ignorância forçada em que estas mulheres viviam, e a forma como o acesso à informação lhes era controlada e como isso começa por condicionar a sua resposta. A certo ponto a tal voz em off afirma que sempre lhes foi negada sequer a possibilidade de pensarem sobre a sua condição, que faltam-lhes as palavras para falar sobre o que aconteceu porque não falavam, não pensavam sobre os seus corpos, e que perante essa ausência restava apenas um silêncio atroz. Será apenas através do lento preencher desse silêncio, do despertar a que assistimos ao longo do filme, mesmo que por vezes de forma atabalhoada, mesmo que noutras vezes através de um pensamento demasiado elaborado para quem vivia até aí tão isolado, mas é através da necessidade de ocupar esse vazio que conseguem assim chegar a uma nova ideia de perdão e de fé, diferente da que lhes foi (imposta)ensinada. 

É difícil pensar no adjectivo panfletário ou activista ao olhar para o filme: acima de tudo, proporciona ao espectador o espaço para chegar às suas conclusões e diferentes formas de empatizar com estas mulheres.

Para chegar a este caminho, é também importante uma escolha de Polley: o filme acompanha estes momentos de debate com pequenos flashbacks fugazes, que aos poucos vão revelando o verdadeiro espectro horroroso dos ataques: com cada um, tornam-se claros os pormenores que não conhecíamos, e que levaram ao tal silêncio: percebemos finalmente que todas as mulheres da comunidade foram atacadas, das mais novas às mais velhas; que os ataques eram muitas vezes perpetrados por pessoas próximas da vítima, como no caso de uma rapariga violada pelo irmão; percebemos finalmente que muitas vezes deram origem a gravidezes, e que algumas das crianças da comunidade são resultado de violações, e que até crianças foram vítimas. É um exercício de controlo da informação que o filme impõe perante o espectador, que dessa forma coloca o espectador ao lado destas mulheres na sua tentativa de compreender o que aconteceu, e assim acompanhar a evolução do discurso e a sua quase própria surpresa perante a sua posição em grupo, em que a sua escolha afinal só pode ser uma, no sentido da sua auto-preservação.

São momentos que transformam o filme em algo mais complexo do que aparenta, dando ao espectador ferramentas para empatizar com esta história, mesmo que olhando de fora para uma comunidade fechada. E não deixa de ser curioso que num filme dominado por palavras, essas imagens fugazes acabem por dominar o filme. É muito comum hoje em dia a crítica fugir de qualquer filme com uma mensagem política, porque não é suposto dizerem-nos o que devemos pensar, ou aborrecer-nos com assuntos que ocupam o quotidiano – e é óbvio que esta história funciona como uma alegoria de um terrível problema que persiste por todo o lado, quase que apresentando esta comunidade como uma sinédoque para a sociedade actual. Mas é difícil pensar no adjectivo panfletário ou activista ao olhar para o filme: acima de tudo, proporciona ao espectador o espaço para chegar às suas conclusões e diferentes formas de empatizar com estas mulheres, tal como a figura masculina que toma conta das minutas da reunião, testemunhar o preencher do tal vazio do silêncio. E isso já não é pouco.

★★★☆☆ 

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2020'sSarah Polley

João Araújo

"I don't think the film has a grammar. I don't think film has but one form. If a good film results, then that film has created its own grammar" Yasujiro Ozu in "Ozu and The Poetics of Cinema", David Bordwell

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