“(…) como um estenograma onírico.”
Walter Benjamin, Sonhos (2020)
“What they all have in common
is that they look like forms created by flowing water.”
John Berger, Past Present, The Guardian
Terá a força das imagens o poder de ressuscitar quem vive na terra dos vivos mas está morto sem o saber? Nada me parece mais pertinente perguntar. De uma forma ou outra, seja nos momentos mais intimistas ou os que acontecem de passagem, a vida da alma parte do acesso à claridade da linguagem, que se abre apenas para aqueles que estão dispostos a aceitar uma falta de controlo nas vidas que levam. Com a vitória de Samantha Harvey ao Booker Prize no final do ano passado, assinala-se o regresso à celebração de obras que se ancoram primeiro à palavra para localizar uma história, em vez do oposto. No cinema, cabe a realizadores-autores como a muita galardoada Alice Rohrwacher, com as suas efabulações romanescas, re-atribuir a poesia a um mundo que parece passar o tempo a emagrecer-se das imagens que o iluminam. No caso de Rohrwacher, é mesmo verdade quando se escreve, a cada estreia de mais um filme seu, que esta invoca um mundo que já se perdeu e um cinema que desapareceu, porque é não-verbal e epicúrio por um lado, e por outro porque o desenho é cantado por trovadores-filósofos, denso o suficiente para poder ser uma construção propriamente dita, algo indecifrável a olho inexperiente. É o cinema oferecido enquanto queda numa experiência que é sensorial e se abraça facilmente ao eco da nostalgia, onde cada imagem acumula significado. Nenhuma é desperdiçada ou esquecida, em função da acção ou sua pontuação. E muitas regressarão, mais tarde, depois de dado o tempo ao espectador para absorver informação e passar a saber sobre elas. No reino de um registo romântico-onírico, entre o telúrico e o espiritual, deixa de ser possível partir ou separar os filmes da forma tradicional. As imagens seguem, em linha recta, à procura de agarrar outra peça, para eventualmente poderem regressar.

“Imaginem uma teia de aranha (…) e imaginem que ao longo dela se encontram pendurados pequenos sinos. Toquem na teia e todos os sinos tocarão. É isso que o filme de Rohrwacher me fez sentir, como uma superfície supersensível minada de emoção, cada momento harmonizado com o seguinte, ou com muitos outros.”, escrevia o escritor Garth Greenwell na sua newsletter (1), na tentativa de colocar em palavras porque é que La Chimera (A Quimera, 2023), a mais recente longa-metragem da realizadora, se tratava de um poema. O mesmo ver-se-á acontecer em Corpo Celeste (2011) e Le Meraviglie (No País das Maravilhas, 2014) e Lazzaro Felice (Feliz como Lázaro, 2018).
Com uma retrospectiva completa que se estende até 26 de Fevereiro no Batalha Centro de Cinema, eis a oportunidade de auscultar a sua voz autoral, que parte sempre da oferta de nutrição (dos que lhe põem os olhos – os que se encontram dentro do filme são normalmente alvo de perseguição), processo onde se vê uma determinada noção de colectivo fortalecida (pontos de contacto em vez da prisão do indivíduo), na investigação não só do herói(na) mas de um todo maior, do tecido do povo local que participa nos filmes (Alice parte sempre de cenários reais, como o campo de tabaco em Lazzaro Felice, e faz uso de actores não-profissionais) à história de um país. Há um nervo activista que é accionado. O seu cinema não faz uso destes territórios, quer mostrá-los como são.

Sendo a feitura de um filme um acto de escavação arqueológica, como a realizadora o tem vindo a descrever ao longo dos anos, essa escavação torna-se literal com uma introdução à ideia da “criação de imagens enquanto gesto de fé” (2), num mundo moderno “onde é cada vez mais difícil de nos escondermo-nos dos outros”, como nos diz Francisco Valente no seu livro Espelho Mágico (2024), em relação a Le Meraviglie. Com a modernidade a irromper pelas costuras, a responsabilidade de não congelar o tempo e deixar o passado entrar fica entregue às criaturas mitológicas de Alice, com os inícios dos filmes a informarem o trabalho pela frente.
Rohrwacher traz consigo desde os primórdios da criação de uma linguagem que já dizia Walter Benjamin é uma linguagem do espanto, o sonho purgatorial, acordado não para uma mas entre duas realidades. Uma linguagem que “não está nas palavras, mas sob elas.”
Em Corpo Celeste, faróis de carros entrecortam a escuridão da noite, e um conjunto de pessoas apontam lanternas para o chão para melhor verem o caminho ladeado de pedras à sua frente. Em Le Meraviglie, mais faróis de carros na escuridão da noite, homens munidos de cães e espingardas, focos de luz e lanternas que nos apresentam a casa isolada onde o filme decorrerá. Em Lazzaro Felice, começamos de madrugada num cenário igual aos demais na sua imediata imensidão e isolamento típico das paisagens rústicas italianas, pirilampos a cobrir o ar, e um homem arranja o cabelo de um rapaz enquanto este agarra nas mãos uma gaita de foles. Em todos estes inícios, há um imaginar de um mundo na escuridão, um momento em que é pedido aos homens que se habituem a ela para nela conseguirem ver, e o sucessivo abrir de olhos ao confronto com o real. Os sons revelam a localização periférica (e por isso pesada), campestre. Um espaço aberto, sem superfícies para tactear, mas onde não se pode confiar onde se coloca os pés, e onde é possível estar-se perto do destino pretendido sem se saber. Já em La Chimera, os olhos abraçam uma febril luz do sol pousada na face de uma jovem rapariga, os seus cabelos loiros e olhos azuis, enquanto esta encara quem se encontra por trás da câmara, fora do nosso campo de visão. Um homem colocará a sua mão por cima do ombro dela, e cobrirá a tatuagem de um sol na sua omoplata, até o olhar dela voltar ao dele, e esse toque o fazer despertar numa carruagem de comboio.
A mudança em La Chimera confirma o ímpeto (neo)-realista social, encardido mas sempre ternurento, que Rohrwacher traz consigo desde os primórdios da criação de uma linguagem que já dizia Walter Benjamin é uma linguagem do espanto, o sonho purgatorial, acordado não para uma mas entre duas realidades. Uma linguagem que “não está nas palavras, mas sob elas.” Nada faz então mais sentido quando explicava a realizadora à revista Interview em 2023, “Não é como se o meu pensar viesse de cima. Vem mesmo é de baixo”, quando lhe perguntaram sobre a poesia através da qual uma história é contada. No caso de Alice, é de notar que tudo começa na matriz autobiográfica e nessa exploração. Nascida e criada a uma hora de distância de Sacro Bosco, na região rural de Úmbria, em Castel Giorgio, onde a realizadora ainda vive, de mãe italiana e pai alemão, ambos apicultores, o parque das criaturas feitas de pedra é o “sítio muito importante na minha vida” (3), disse. Construído no séc. XVI em Bomarzo, o jardim dos monstros, que motivou Salvador Dalí em meados de 1940, figura a verdadeira intenção de Alice em tudo o que faz. Sobre uma casa em particular, a casa inclinada que agora dá a cara a esta vila de maravilhas, a ‘Boca de Orcus’ (entendido como o espírito da morte), diz-nos que “Está inclinada. E quando sais dela, tudo mudou. Distorce uma ideia de realidade, e isto é algo que tento fazer com o meu cinema, oferecer algo que é muito real, como aquela pequena casa, mas também um pouco torto, para que expanda o olhar” (3).
Se o nosso primeiro contacto com Alice passa-se por um habituar dos olhos à escuridão para nela vermos (assim é o cinema), acabamos essa aclimatização com o movimento oposto: ler a realidade no seu surrealismo, na sua perseguição pelo que é sagrado, uma verdade entretanto invisibilizada.
E assim o é. Ao contrário do que é imaginado, Alice não parte da fábula para falar sobre a realidade. Manipula a realidade para trazer ao de cima a fábula, o artifício sentido enquanto calcamos o mundo, quando tudo parece ser demasiado belo para ser real, e para o qual não parecemos ter palavras. O cunho é, por isso, documental mas todo ficcionado, para através da ficção tocar na magia. Cinema incisivo, mas colorido e lustroso, com arestas suaves. Com vista a melhor extraí-las, recorre-se ao uso de todos os formatos rudimentares, matérias vivas que se realizam durante a rodagem e nunca depois dela, e que chegam a misturar-se, nomeadamente em La Chimera: de 16mm a super 16 a 35mm, segundo o olhar dourado da directora de fotografia Hélène Louvart (que também já trabalhou com Wim Wenders, Eliza Hittman, Mia Hansen-Løve). As raízes da realizadora são a coisa mais importante de todas. Também as fronteiras territoriais (entre a Toscânia, Lácio e Úmbria), e não só do cinema, desaparecem. Voltamos à antiga Etrúria. E a uma dicotomia sempre presente. Uma dimensão térrea e em formato de caixa quase, repleta de sinalética (uma catrefada de estímulos) que, caso seja lida e interpretada, abre um reino divino. Os vivos e os mortos, interligados. Voltando a Garth Greenwell, diz-nos que La Chimera é um poema também “no seu investimento em espaço lírico, nos espaços removidos pelo tempo.” Mas para isso há que entrar na boca do monstro.

Enquanto isso, a Alice cineasta vai crescendo assim que a percepção e investimento no mundo também de Alice pessoa se desdobra. Prossegue para o futuro para nele descobrir o passado perdido, a memória colectiva da História de um país através dos seus muitos vestígios soterrados, físicos mas não só, para finalmente fazer sentido do tempo presente. É uma tarefa hercúlea, até utópica já para não apontar para o óbvio e falar do seu carácter político, este da levitação do que da História acabou inscrito palmos abaixo do chão, ou do que permanece, gerações depois, vivo dentro das pessoas. Aliado a isto, a cineasta não quer falar de propriedade. Nem da dos seus filmes nem dos artifactos de que abundam os microcosmos dos seus filmes (são de todos). Não, não é para isso que ela está aqui. Como em Allegorie Citadine (2024), anseia por aquele arrancar que afinal não é parede do edifício mas papel autocolante (bela parceria com o artista JR), em direcção à caverna (a mesma de Werner Herzog) a partir de onde se formaliza a entrada. Esta tarefa não lhe pertence, foi-lhe atribuída. Ser vítima de uma febre fulminante ajuda.
A partir daí, os EUs de Alice, todos espíritos livres, cujo crescimento testemunhamos, serão os condutores entre estes dois mundos. E como do que falamos aqui é de um portal torto que flutua entre tempos cronológicos, faz sentido que os filmes se apresentem então tais sonhos febris que se assemelham em muito com a nebulosidade de memórias de infância; uma sucessão interminável de domingos num país católico e numa paisagem provinciana, as refeições em família, esses vagares e os seus espantos que permanecerão inarráveis. Enquanto isso, nesse comprimento de onda, memorizado pelo sol que queima e pela humidade da chuva de verão, a surpresa felliniana que se arrasta com o bradar da banda de música, a presença dos saltimbancos e da restante procissão popular que invade as ruas. Tudo é tão pessoal e particular, e ao mesmo tempo indefinido o suficiente para o esforço de encaixar o país das maravilhas de Alice na realidade fazer exacerbar o seu realismo. Por ele caminham verdadeiros flâneurs, presenças parte humanas parte fantasmagóricas que vagueiam desde a madrugada do tempo a caminho de algo que não conhecem, mas que julgam que lhes será familiar assim que o virem.
A preocupação física da anatomia dos muros desvanece-se de filme a filme, enquanto um caos controlado se acumula e prolonga de filme a filme. É construído uma espécie de ninho que não pertence a ninguém, mas é de todos. O cinema torna-se o abrigo, onde se torna possível escondermo-nos dos outros.
Há, em todos os filmes, uma figuração de uma rapariga ou homem que começam curvados sobre si mesmos (ou assim se projectam, para que assim neles pensemos), a maior parte das vezes sujos, uma abelha a pousar na cara, a lua cheia a iluminar a noite, sofredores de alguma maleita ou ansiedade que os fere e inunda de melancolia, retirando-os da sua realidade mais vezes que não enquanto resistem ao implacável verão italiano, a mesma tonalidade da luz das velas. Para eles, o conceito de viver como entendemos perdeu todo o seu significado. Atingiram o nomadismo. Tornam-se imagens cinemáticas, que dependem da projecção do cinema para não se evaporarem. E estão, como seria de calcular, sujeitos a esse aumentar de intensidade. Em Un Piccolo Spettacolo (2005), co-realizado com Pier Paolo Giarolo, primeiro filme da realizadora após completar os seus estudos em ciências religiosas e da antiga Grécia, confirma um desejo imponente em falar sobre uma percepção autêntica de liberdade que se esfuma rapidamente – esta, liberdade, permanece a palavra-chave para abrir o cofre de sinais e pistas deixadas pela cineasta.
Seguindo a linha de pensamento de John Berger, “para os nómadas, a noção de passado e futuro é talvez dependente da experiência de um outro lugar. Algo que já não existe, ou é aguardado, encontra-se escondido num outro lugar. Para ambos caçadores e presas, o acto do bem esconder é um pré-requisito para a sobrevivência. A vida depende de encontrar abrigo. Tudo se esconde”, nasce uma ideia de cinema onde há que traduzir nas entrelinhas, procurar nas fendas. O corpo é apenas uma indicação. Muito mais existe se nele nos perdermos. A começar com a jovem Marta em Corpo Celeste, que trava a luta com o início da puberdade e a realização do catecismo, um filme alerta para as questões corpóreas que abrangem o aspecto estrangeiro do corpo de Marta, do corpo da religião católica, do corpo do cinema (a máquina e o seu operador). A preocupação física da anatomia dos muros desvanece-se de filme a filme, enquanto um caos controlado se acumula e prolonga de filme a filme. É construído uma espécie de ninho que não pertence a ninguém, mas é de todos. O cinema torna-se o abrigo, onde se torna possível escondermo-nos dos outros.


São vários os momentos que potenciam o típico delírio do circo felliniano, anárquico mas prudente, que espelha o que se passa dentro dos muitos corpos assaltados, personificações de bondade e inocência anti-capitalistas. Marta caminha por uma estrada ventosa repleta de lixo. Aos seus passos determinados, o lixo acompanha-a rua fora. No final deste caminho, corta o cabelo com uma tesoura (Corpo Celeste). Gelsomina regressa para a família que dorme em mantas no chão, fora da casa que foi o seu lar (Le Meraviglie). Lazzaro permanece imóvel na chuva torrencial (Lazzaro Felice). Um corpo de uma rapariga desaparece no prado onde “mergulha”, ao som da valsa de Alfred Schnittke, através do “olho mágico” da câmara super 8 (Quattro Strade, 2020). Serafina guarda um pedaço de bolo de natal (zuppa inglese) e distribui migalha a migalha por todas as raparigas no colégio interno (Le Pupille, 2o22). Arthur, no momento em que encontra e puxa o fio vermelho naquela catacumba (La Chimera).
Para além de brincar com a hibridez da forma e do registo, e com aspect ratios e formatos de película, a poesia de Alice transpira dos signos deixados. Por vezes a pontuar os filmes, como palavras que rimam. Outras vezes, são alegorias levadas ao extremo, como espaços em branco que ela preenche mas que só os espectadores podem confirmar. Mais uma vez, Alice está preocupada com o todo, o colectivo enquanto única sobrevivência (assim vemos mais explicitamente em Omelia contadina (2020), co-realizado com JR, onde é organizado um funeral à biodiversidade com os agricultores que perderam os seus negócios para as grandes multinacionais, sedentas de lucro). Na remoção dos códigos do individualismo é impresso na medula de um cinema (mais italiano seria impossível) a energia fibrosa da resistência. Não é por coincidência que Alice trabalha sempre com o mesmo produtor Carlo Cresto-Dina, mesma directora de fotografia Hélène Louvart, mesma directora de arte Emita Frigato, a mesma figurinista Loredana Buscemie e a irmã, a reluzente actriz Alba Rohrwacher.


Um sentimento de eternidade vive então na obra, até agora conseguida, de Alice Rohrwacher. O motor potenciado pela felicidade de uma comunidade familiar. A sua obra retém o que é identificado como imagem do cinema passado do país – a sua impressão digital é parte rosselliana -, expandindo e esticando o discernimento de “passado” enquanto um ser vivo, em movimento (adicionar uma fase entre a sua glorificação e destruição). Está ali para nos dizer, uma e outra vez que o que mais vigora é a capacidade para o vínculo artesanal com o mundo lá fora, a natureza outra vez, viver do corpo dele e com ele num zumbir que entrelaça, em vez de ostracizar. Daí o fantasiar da realidade através de, nas palavras do escritor James Woods, um “talento para a metáfora” (Woods parte da ideia de metáfora do filósofo Ted Cohen), no sentido em que “este é um motor que impulsiona a forma como nos identificamos com personagens (…) a metáfora pede-nos para ‘pensar numa coisa enquanto algo que não é’” (4). Se o nosso primeiro contacto com Alice passa-se por um habituar dos olhos à escuridão para nela vermos (assim é o cinema), acabamos essa aclimatização com o movimento oposto: ler a realidade no seu surrealismo, na sua perseguição pelo que é sagrado, uma verdade entretanto invisibilizada.
“Não foste feita para olhos humanos”, sussurra Arthur no momento mais comovente de La Chimera, momento que ilumina a tese de Alice enquanto hino polifónico ao que é orgânico e tocável com mãos humanas. Estes filmes não foram feitos para quem neles apenas quer ver. Aliás, a ironia deste ensaio que chega agora ao fim é que tal como os artefactos de arte intocados pelo ar do presente, a obra de Rohrwacher está alerta para a sua própria destruição assim que olhos repousem nela à procura de significado. A distorção é inevitável. Pelas comunidades rurais fora, do isolamento católico em Corpo Celeste à família de apicultores em Le Meraviglie à exploração laboral dos meeiros em Lazzaro Felice, Alice empunha a sua câmara e regista, tatuando o passado da ruralidade (a mesma pureza de Víctor Erice) na industrialização do presente (o seu cinema é fruto de preocupações muito contemporâneas, afinal). Nada é mais oceânico que este sentimento de respeito prestado tanto ao território como à própria imagem, e sua construção. Há muita esperança no acto de se balançar em bicos de pés na borda do vácuo para que seja possível finalmente denotar o relevo da fraqueza humana, do seu conceito de progresso. Como é que nos esquecemos que carregamos o peso do que já aconteceu às costas?
“Eu quero que a Terra se torne um lugar melhor, para que possa viver mais tempo. Somos meros convidados aqui”, diz-nos um jovem em Futura (2021), documentário feito com outros realizadores durante a pandemia de covid-19, e um exercício que acentua os receios da juventude italiana em relação às suas perspectivas de vida. As palavras podem não realizar a totalidade do seu cinema, mas a imagem mental que este desejo projecta é a mesma de Orbital, de Samantha Harvey. A cadência destas imagens, a existir em função umas das outras como num poema, e também como num poema mergulhadas em sol, alimentam o que não é possível ver a olho nu: o reino dos que vivem para preservar uma essência de alma. Com alguém crente o suficiente a convocar essa abertura. Alice Rohrwacher é essa luz.

Notas:
(1) To a Green Thought: https://garthgreenwell.substack.com/
(2) Entrevista com Jonathan Romney, The Observer, 31 Março 2019
(3) Entrevista com Jeremy O. Harris, Interview, 13 Outubro 2023
(4) Woods, James, The Nearest Thing to Life (1965), p.49
