Hugo está à janela. A janela está fechada e o Inverno escreve-se com os ramos despidos das árvores e as nuvens cinzentas. Lá fora chove. Ou pode até não chover. Lá fora passa-se a luz, os oito milímetros num grão tão aberto, a claridade escura, o Terreiro do Paço em obras, os arranha-céus das pinturas. Isto vemos nós, mas o que vê ele? Ana Maria está à janela. A janela está aberta de par em par e apenas uma das portadas está tapada pela cortina azul, enfunada pelo vento. Lá fora passa-se o mar, a luz do sol, terra e um barquinho ao longe cuja distância parece tornar em barquinho de brincar. Isto vemos nós, mas o que vê ela?
O presente texto foi publicado no livro de compilação O Cinema Não Morreu – Crítica e Cinefilia À pala de Walsh. Pode adquiri-lo junto da editora Linha de Sombra, na respectiva livraria (na Cinemateca Portuguesa), e em livrarias seleccionadas.