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À pala de Walsh
Críticas, Em Sala 4

L’image manquante (2013) de Rithy Panh

De Carlos Natálio · Em 2 de Abril, 2014

Ainda há menos de um mês estava eu a olhar para nefertitis, polvos gigantes de olhos fofinhos e céus rosa shocking e a pensar qual o papel da animação no filme de Ari Folman. A quem engano eu? Estava a pensar no papel de toda a animação, tout court, e que esta “derrota” de Bazin proclamava precisamente que o cinema mostrava, em todo o seu esplendor, o contraste entre as cores maravilhosas e os triunfos futuros da química (“live your dream”, logo, “no more dream”) e o quarto-de-arrumos desolado e destruído em que se tornaria o mundo não animado. Em The Congress (O Congresso, 2013) é essa “nostalgia da desaparição” do corpo real que está em causa e esse insuflar da animação 24/7 num corpo imaterial, sem limitações, sem sono.

L' image manquante (A Imagem Que Falta, 2013) de Rithy Pahn

Pode parecer ridículo (e até de mau gosto) comparar essa desaparição nostálgica que detectamos genericamente como traço do avanço técnico e da cultura com o desaparecimento – esse, concreto, brutal, factual – que Rithy Pahn experimentou na sua infância e que exorciza neste seu terceiro tomo da trilogia sobre o massacre cambojano, L’image manquante (A Imagem Que Falta, 2013). Os primeiros foram S-21, la machine de mort Khmère rouge (2003), onde foi entrevistar guardas e prisioneiros de uma das prisões mais mortíferas do regime de Pol Pot, e Duch, le maître des forges de l’enfer (2011), o principal mentor da dita prisão e do dito genocídio. O que impressionava nestes filmes é que uma pessoa que aos treze anos foi enviada juntamente com a sua família para campos de trabalhos forçados pelo partido comunista dos Khmers vermelhos e que a viu praticamente toda morrer de fome à sua frente, pudesse, anos depois, pegar numa câmara pronta a “disparar” 24 fotogramas por segundo e ainda tivesse a humildade, o respeito, de deixar que fosse o Duch e outros assassinos a “disparar” sobre si próprios. Esse era também o respeito por outra coisa que entretanto se tornara importante na sua vida: o cinema e, mais especificamente, uma ética documental.

Mas volto ao sacrilégio para completar as comparações entre o desaparecimento dos corpos reais de Folman e o desaparecimento das imagens que sempre voltam a Rithy Panh. No início do filme vemos bobines destruídas pelo tempo e percebemos que as imagens que faltam são as que testemunham os crimes em massa que assassinaram um quarto da população do país. Quem as registava foi executado e as que sobram são de propaganda, mostrando um sorridente Pol Pot batendo palmas, abraçando homólogos chineses e promovendo a sociedade mais “justa e igualitária” do mundo. Mas como diz a narração na primeira pessoa (Panh escreveu-a a meias com Christophe Bataille): “para sobreviver tens de esconder uma força qualquer dentro de ti, uma memória, uma ideia, ninguém ta pode tirar. Se uma imagem pode ser roubada, um pensamento não”. E essas imagens pessoais, as de família, tinham sido roubadas e por isso L’image manquante é um “documentário” de evocação desses pensamentos interiores de sobrevivência e a sua exteriorização nas imagens possíveis. Essas são extraídas dos elementos naturais, da terra e da água (a “escrita” da população era feita nos campos de arroz com as enxadas; na lama, que por vezes tinham de beber, eram enterrados em valas comuns) surge a argila com que o escultor Sarith Mang (a quem apenas vemos as mãos) modela as figuras com que Panh se revive e documenta o horror da sua infância e do regime comunista cambojano. Neste exercício que tem mais de catarse do que de processo judicial histórico é a “animação não animada”, as figuras, que, como em The Congress, vêm tentar colmatar uma desaparição, procedendo a uma substituição. Se não há imagens de família, se não há vídeos de família, façam-se agora. São essas imagens “manquantes” que o cineasta está condenado a criar, como um preenchimento de uma falta, a reposição de uma verdade.

Ainda como em The Congress (prometo que é a última vez) está em causa uma ideia de contraste. Se aqui há uma imagética rica de mares psicadélicos e trips de ácido com o oposto do cinzento das zonas não animadas, no filme do cambojano esse contraste é – além do óbvio, entre o assunto sério do genocídio e o uso de bonecos, símbolos de inocência – entre uma imagética falsamente “pobre” na sua imobilidade e uma extrema mobilidade da emoção humana, que humildemente aquela permite veicular. Essa é a tensão do filme, entre o que se mexe e o que fica, entre um acto de memória e um acto de esquecimento, entre a reconstituição humana de argila e a fragilidade humana da carne. Como diz Panh, “não há verdade, só há o cinema, o cinema é revolução”. Se para ele o cinema constitui uma “fuga” (fuga aparente, uma vez que, como o melhor dos autores, está condenado a ficar preso, a fazer para sempre o mesmo filme sobre o fantasma que o assombra), é aquele que permite essa genial transfiguração dos bonequinhos em personagens, do retrato que, pelo extremo detalhe, deixa entrar a barbárie pela inocência adentro (a cor da camisa do jovem Rithy Panh sobressai resistente perante as faces dos bonecos que, esquálidos, emagrecem de fome, a única coisa que se partilha; o filho que condena a mãe à morte ao denunciá-la por roubar mangas). Perante todas estas imagens interiores de terror, a “revolução do cinema” não as esquece mas antes mostra-as por via de mãos novas que criam, de vozes calmas que recordam, da presença dos mortos que permanecem, leves, pairando, sobre a terra, sobre a argila.

Quando um auto-retrato apenas consegue invocar imagens de morte, quando revisitar a infância obriga a construir um ensaio político, apetece continuar a inversão começada em L’image manquante. Se a animação é a imagem-trauma para o desfalecimento da condição humana, nada nos impede de pensar num tempo em que tudo isto já só pertença à mais pura das animações. Porque o cinema, esse, é a revolução.

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2010'sAndré BazinAri FolmanChristophe BatailleRithy Panh

Carlos Natálio

«Keep reminding yourself of the way things are connected, of their relatedness. All things are implicated in one another and in sympathy with each other. This event is the consequence of some other one. Things push and pull on each other, and breathe together, and are one.» Marcus Aurelius

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4 Comentários

  • Alto contraste matizado | À pala de Walsh diz: 25 de Maio, 2014 em 20:51

    […] (2012) de Marcelo Machado – também exibido no Heart Beat do DocLisboa 2012 -, L’image manquante (A Imagem Que Falta, 2013) de Rithy Panh – exibido fora de competição no LEFFest 2013 […]

    Inicie a sessão para responder
  • Le dernier des injustes (2013) de Claude Lanzmann | À pala de Walsh diz: 22 de Janeiro, 2015 em 20:16

    […] dos melhores filmes estreados em Portugal no ano passado, L’image manquante (A imagem que falta, 2013), o seu autor Rithy Panh propôs-se criar imagens animadas para o massacre cambodjano levado a cabo […]

    Inicie a sessão para responder
  • Concerning Violence (2014) de Göran Olsson | À pala de Walsh diz: 28 de Abril, 2015 em 15:44

    […] queiram ausentes pela força do seu testemunho – Rithy Panh referia recentemente no seu filme l’Image Manquante (A Imagem Que Falta, 2013), provavelmente influência pela pena de Didi-Huberman no seu Images malgré tout, onde afirmava que […]

    Inicie a sessão para responder
  • DocLisboa 2016: quatro rotas, infinitos caminhos | À pala de Walsh diz: 18 de Outubro, 2016 em 16:44

    […] (2016); Rithy Panh com Exile (2016) (realizador de Duch, le maître des forges de l’enfer e L’image manquante); e Sergei Loznitsa com Austerlitz (2016). No entanto, também nesta secção há nomes menos […]

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