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À pala de Walsh
Contra-campo, Sopa de Planos 0

João Pedro Rodrigues: a causa do amor à deriva na cidade

De À pala de Walsh · Em 7 de Outubro, 2022

Em 2022 João Pedro Rodrigues (e João Rui Guerra da Mata) estreia duas novas longas-metragens: em Cannes, na Quinzena do Cineastas, Fogo-Fátuo (2022); poucos meses, Onde Fica Esta Rua? ou Sem Antes Nem Depois (2022), na seleção oficial do festival de Locarno (fora de competição). Agora que o primeiro estreia comercialmente nas salas portuguesas (depois de ter sido o filme de abertura do QueerLisboa) e o segundo é apresentado no Doclisboa, convidámos os walshianos a destacarem, da filmografia dos realizadores, um só plano que traduza a sua relação com este cinema feito de corpos e cinefilia, de sexo e barroco, de violência e saltos altos. Eis os cinco ingredientes que compõem esta Sopa de Planos.

O Fantasma (2000) de João Pedro Rodrigues

Um cão percorre um corredor, arranha uma porta e força a entrada. O animal cheira e rosna, aflito. Do lado de dentro, num quarto, dois corpos masculinos, um deles coberto por um manto negro de látex. A figura de negro domina o outro homem, numa toada sexual violenta e invasora. É a primeira sequência de O Fantasma (2000), a primeira longa-metragem de João Pedro Rodrigues. O reencontro com o filme redescobre memórias de um período em que começávamos a mostrar cinema, enquanto descobríamos autores e filmografias. O cinema de João Pedro Rodrigues surgiu-nos, então, como um sobressalto, tão brusco quanto o seu protagonista. Um olhar nocturno, transgressor e fetichista, a desafiar as convenções; mas para lá disso, na presença de uma força primordial, de um instinto animal, a saciar o desejo do herói a negro, que triunfaria sobre a rejeição apoiado no cinema, ao romper uma noite americana, para se erguer numa colina de lixo na cidade de Lisboa.

Vítor Ribeiro

Odete (2005) de João Pedro Rodrigues

Já escrevi tantas vezes sobre Odete que pareço ter chegado a um ponto em que, para manter a minha relação privilegiada com ele (porque é um privilégio amar assim um filme), devo começar a renunciar à linguagem. Durante os anos em que o cinema de João Pedro Rodrigues, e em particular esta segunda longa-metragem, foram particularmente incompreendidos, e muito mal vistos (no sentido de serem mal lidos), tomei para mim a causa “JPR”. Todos os que se cruzaram comigo sabem isto. Hoje já não sinto ser necessário procurar legitimar o cinema de Rodrigues, explicando-o a quem não o compreende. Quem não compreende estes filmes, nos dias que correm, não quer compreendê-los. Durante cerca de dez anos, ensinei amigos, conhecidos, alunos, professores e colegas a ver Odete. Em alguns casos, consegui, talvez, ensinar a sentir Odete, e, até, a viver Odete. O rosto de Odete está impresso na capa do meu segundo livro, permanecendo assim, para sempre, associado a mim e ao meu nome (há algo de placa tumular na capa de um livro; e nas dos meus há mais que algo: há muito). Em certa medida, Odete e eu confundir-nos-emos na memória do mundo. 

Posto isto, gostaria de transitar agora para o modo de comunicação que Pedro adopta neste momento inicial do filme, em que as palavras (“amo-te”) dão lugar a sangue e silêncio. Eu também amo este filme, já o provei (como Pedro), e talvez precise agora de me fantasmagorizar nele para que o nosso amor não se banalize na trivialidade da linguagem. A metamorfose completou-se e tornámo-nos co-substanciais. Já não há lugar para mim no vosso mundo.

José Bértolo

Morrer como um Homem (2009) de João Pedro Rodrigues

No cinema classicista, a iconicidade, herdada da pintura, foi a maneira de esterilizar (de devir, de História) e sublimar (idealizando-a como imagem transfixada no céu da Ideia) os mais caros objetos de veneração para o protagonista do Bildungsroman da Verdade, subtraindo-os à História para melhor esculpir seu modelo exemplar segundo os metros do Eterno: o Pai, a Casa, o Eterno Feminino. Num contexto que em nada deve às Gestas reconciliadas do classicismo, o icónico volta em Morrer como um Homem (2009) para falar de uma sacralização do quotidiano imanentista, dos embates de cash and sex do submundo enodoado de sémen e heroína contaminada da vida de travestis, profissionais ou não, na arte narcisista de cerzir uma máscara para a jouissance do Outro. Deste Purgatório de interesses mundanos, Tónia, católica e em vias de mudar de sexo, deseja a todo custo escapar; ela, que na segunda metade do filme em certa medida vai conseguir o seu intento, sob os auspícios de uma fuga musical e de uma égloga frugal, guiada por travestis artistas; no entanto, para olhos videntes que reparam na cola dos raccords, já habita um Outro mundo; pois não veem o fotograma acima?

É não apenas a segunda parte tamisada de luz, música eudaimónica e cor escarlate, mas todo o filme que aspira à separação do sagrado: a maior parte das sequências de Morrer como um Homem acaba por estacar, se transfixar, se imprimir num plano icónico, que sublima e enleva a sujeira ao redor em um coágulo de formas ideais: é talvez, em chave de fantasia mortuária redentorista, o equivalente ao gestus brechtiano, em que o sublinhado exclamativo do dedo anelar tinha por função indicar o próprio gesto de indicar; aqui, a iconicidade de gestos como o de Rosário com o peixinho estremecendo de morto na mão ou de Tónia tinta de sangue na boca após apertar as costuras da roupa de uma companheira negra são espécimes de mementi mori para transfigurar as pequenas disputas, o pitoresco vez ou outra irritante mas necessário à economia sublime do todo (sequência feérica do cabeleireiro, com a cadeira a rodar), as miudezas hebdomadárias e nos revelar que, para o filme na sua totalidade, como para o mundo interior da mística maneirista de Tónia, a grande conversão – de que o encontro com Maria Baker é a mise en scène mais brilhantemente instrumentalizada, expressamente tematizada: o Paraíso é aqui –, tudo já se deu no corpo convulso de sintomas do próprio filme, invólucro somático de uma transfiguração espiritual a que assistimos os atos: uma Paixão crística queer que, ao final de cada sequência transfixada no gesto icónico, nos eleva e enleva do Purgatório comezinho do quotidiano aos grandes cimos do imaginário escalonado pelas estações páticas. São Paulo nos advertia elegiacamente que a figura deste mundo está passando, e não é outra a lição que nos dá a iconicidade sacer do mundo em vias de findar de Morrer como um Homem.

Luiz Soares Júnior

Manhã de Santo António (2012) de João Pedro Rodrigues

No final de O Fantasma (2000), João Pedro Rodrigues conduz Sérgio (Ricardo Meneses) para um buraco negro que parece ter consumido qualquer réstia de vida. Em Manhã de Santo António (2012), Sérgio reaparece figurado num grupo de jovens que emerge da estação de metropolitano e se espalha soporificamente pelo bairro de Alvalade, indiferentes ao trânsito de pessoas e automóveis e às barreiras com que se cruzam, como árvores, paredes ou lagos. Pressentimos a presença da estátua vigilante do Santo António, o santo casamenteiro que domina a praça, na sombra que se abate sobre os prédios ou nos planos picados sobre os elementos do grupo. A alvorada coloca um termo ao reino das sombras e a figura do fantasma surge reconfigurada na do zombie. Trata-se do mesmo contexto social e do mesmo espaço arquitectónico, aqui subitamente pós-apocalípticos, onde João Pedro Rodrigues reside e que ouvimos quando a janela se abre em Parabéns! (1997), a sua segunda curta-metragem, mas também de Os Verdes Anos (1963) de Paulo Rocha, filme que revisita (juntamente com João Rui Guerra da Mata) em Onde Fica Esta Rua? ou Sem Antes Nem Depois (2022). 

Tal como na obra de Christian Petzold, a convocação de figuras do cinema de terror livres de convenções sociais dilui os limites entre o real e o fantástico, o objectivo e o subjectivo. A fantasia individual, repara Thomas Elsaesser a propósito do cinema de Weimar que inspira Petzold, acontece como resposta à luta e ao bloqueio sociais. A agilidade e a elegância monocromática de um fantasma colector de objectos e fantasias eróticas dão lugar ao movimento cambaleante de zombies que repetem mecanicamente ações de uma vida passada. Se o fantasma caminha para uma imaterialidade em que o desejo morrerá, o zombie persegue visceralmente um desejo ilusório que nunca se materializará. Quando, em Manhã de Santo António, um dos jovens (Alexander David) atira violentamente o vaso do manjerico contra a estátua de Santo António, o rapaz cai como morto para se reanimar logo depois, uma vez que que nem a morte o consegue vencer. Já nos parecera que Manhã de Santo António seria uma visão desencantada sobre a falta de vontade própria. Agora parece-nos mais um retrato que vibra, como o telemóvel insistente, de uma juventude encantada.

Carlos Alberto Carrilho

Allegoria della prudenza (2013) de João Pedro Rodrigues

Em apenas um minuto e meio João Pedro Rodrigues faz Allegoria della prudenza (2013). Filma o túmulo onde Kenji Mizoguchi está enterrado, no seu jazigo familiar em Tóquio. São seis planos estáticos que nos oferecem pormenores do cemitério e da lápide. Depois, a segunda campa do cineasta, agora em Quioto: dois planos, sempre fustigados pelo vento (como já eram os anteriores) que se ouve na banda sonora e se vê nos movimentos da folhagem. Surgem então umas mãos (sob um fundo de pequenas flores brancas, desfocadas), batem as palmas duas vezes. Esse único momento de figuração do corpo neste pequeno filme despido estabelece o raccord geográfico que nos faz saltar meio mundo para encontrar em Ovar uma outra urna onde repousam as cinzas de outro cineasta, Paulo Rocha. De novo três planos fixos que oferecem pormenores do jazigo familiar. E, de novo, um plano abstrato da natureza: flores que boiam sobre águas escuras e sobre as quais correm os créditos do filme.

O plano das palmas surge aqui, talvez, como referência a outro filme, de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata, China China (2007), que por sua vez citava diretamente os estalar de calcanhares dos sapatos vermelhos de Dorothy em The Wizard of Oz (O Feiticeiro de Oz, 1939). Ou seja, o modo como se estabelece a relação entre as campas dos dois realizadores através do bater das palmas das mãos (duas vezes) promove a leitura de que o universo mizoguichiano (e o Japão em geral) é um mundo de sonho e fantasia, do qual se pode sair como da terra mágica de Oz, de volta para a realidade (a preto-e-branco), neste caso, Portugal. Como se o universo cinematográfico japonês fosse, para Paulo Rocha, uma fuga à realidade nacional. Há já qualquer coisa de Onde Fica Esta Rua? neste filme-haiku: a aridez, o vento, Rocha, e o lado estrutural (o filme tem 15 planos-sílabas, 3 locais-frases, um esquema de 6-4-4, dois assuntos-realizadores separados por uma pontuação-palmas). Allegoria della prudenza é uma pequena homenagem (filmado pouco depois da morte do realizador português), que antecipa uma outra, maior, que agora lhe dedicam os Joãos. Continuemos a bater palmas a Paulo Rocha.

Ricardo Vieira Lisboa

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