Mais ou menos por volta do meio de Youth (A Juventude, 2015) de Paolo Sorrentino um Harvey Keitel já bastante chupado, a fazer de grande realizador em crise existencial e criativa, dá uma lição de vida aos seus pupilos que o ajudam a escrever o seu filme-testamento, reza assim: reparem nestes binóculos, se olharem através deles vêm o que está ao longe muito de perto, é o futuro visto pelos olhos de uma pessoas jovem, no entanto se olharem pelo outro lado dos binóculos vêm as pessoas que vos estão mais perto muito ao longe, é o passado visto pelos olhos de um homem velho. É desta natureza que se faz a nova empresa de Sorrentino, de metáforas (e símbolos e figuras, e personagens… e tudo) surpreendentemente básicas. Aliás, cada linha de diálogo do filme parece querer encapsular uma moral ou uma qualquer lição de vida como se os personagens falassem por Haikus. Regressando a Keitel, o seu script empancou na frase final, não sabem o que o homem deverá dizer à mulher no seu leito de morte (ou se deverá ser ela que lhe diz algo), Youth por seu lado é um filme construído de frases finais. Cada cena podia bem ser a última, dada a pompa de cada diálogo, e para dizer a verdade até se agradecia.
Mas o grande problema do realizador italiano, mais ainda neste filme, é achar que a palavra operático significa relativo ao Festival da Eurovisão da Canção. Não há um arrebique em Youth não não seja piroso, tudo está revestido de uma goma doce e enjoativa e todo o filme se faz de uma sucessão de números musicais/de circo em paralelo a uma sucessão de actores que desfilam em constante modo de cameo ao ponto de termos um Maradona perturbador a passear-se pelo hotel, um monge do Tibete em constante meditação, um casal de mudos, uma prostituta de classe e até um Paul Dano a fazer de Shia LaBeouf. Esta parada de figuras (hunanas e fílmicas) esdrúxulas aproxima Sorrentino de Harmony Korine, mas onde o segundo trabalha no sentido do estranho, da margem e da auto-implusão, para Sorrentino toda a empresa dá pretensamente mostras da sua habilidade que a cada minuto se confirma como inane. Muito se fala de Fellini quando se escreve sobre Sorrentino. Talvez… um Fellini ultra-pasteurizado pelos formalismos do videoclip (ao ponto de durante o filme um personagem sonhar com um, que Sorrentino filma com desdém sem no entanto se aperceber que é aí que está em casa), da publicidade (do início ao fim assistimos a uma anúncio da Nespresso transido de passagem de modelos) e da televisão (já no final surge-nos uma Jane Fonda que diz algo como o futuro do cinema é a televisão por isso vou fazer uma telenovela para o México – e Sorrentino está de facto a preparar uma série de televisão co-produzida entre a Sky Italy e a HBO).
Vejo o cinema de Sorrentino como as flores de plástico dos cemitérios.
Regressando às lições de vida, o personagem de Michael Caine acha que as emoções são sobrevalorizadas, ao passo que o seu amigo Keitel discorda, ele crê que as emoções são tudo o que temos. Ora bem, parece-me que Sorrentino não está com um nem com o outro, isto é, de facto o realizador parece altamente preocupado com o fazer sentir, com os efeitos sentimentais das cores, dos movimentos de câmara, das músicas, dos ralentis, dos enquadramentos – para eles as emoções não são algo a que esteja alheio, ele deseja-as ardentemente -, no entanto, nenhum desses efeitos resulta mais do que isso mesmo… efeito – se as emoções são tudo o que temos, Youth não tem uma que seja, ou não as sabre transmitir. Numa analogia simples (como a canção), vejo o cinema de Sorrentino como as flores de plástico dos cemitérios: são bonitas ao longe, até são capazes de enganar alguns ao perto, sentimos-lhes o sentimento de quem as lá depositou mas não deixam de ser de plástico, iguais a tantas outras na loja do chinês.